Nesta série sobre a Crise 2.0 procuramos buscar informações em todo espectro político ou ideológico, além de trazer as mais variadas matizes do pensamento econômico, para que formemos um conceito mais amplo sobre o significado da Crise, meu corte é Marxista, mas nem por isto limitamos a análise, ao contrário, ampliamos de forma a ter a maior fidelidade na apresentação de ideias e visão da realidade que assola a economia mundial, em quase onze meses são mais de 130 artigos fundamentando e debatendo a Crise.
Sempre que encontramos números macros sobre os países ou regiões publicamos pois eles facilitam de forma mais precisa a entender como política e economia se expressam na vida das pessoas. A vinculação que determinada política ou decisão econômica, atinge o conjunto da população, ou por vezes porque nos opomos que tais e tais programas não devam ser implementados, como, por exemplo, os atuais planos de austeridades, tido como novos, mas no fundo não passam de recompilação dos velhos receituários do FMI aplicava amplamente na América Latina, a única novidade é que agora aplica na “rica” Europa.
Semana passada li um interessante artigo(Europa, combatendo incêndio com fogo) com números e informações relevantes sobre a Crise na Europa do Professor de Economia,Ernesto Lozardo, da EAESP-FGV, em particular levanta a questão da dívida Privada, das Empresas e famílias, em geral, tratamos sempre da questão pública, neste artigo ele põe em evidência que o desastre privado é bem pior e pressiona em demasia o Estado, leiamos alguns trechos:
“Em 2007, a média da dívida soberana dos países do euro encontrava-se em torno de 56% do produto interno bruto (PIB). A dívida da França, Alemanha, Irlanda, Holanda, Espanha e Portugal estava abaixo do limite do endividamento proposto no Tratado de Maastricht, ou seja, 60% do PIB. A Itália e a Grécia eram os únicos países a terem dívidas elevadas, de 87% e de 105%, respectivamente. Em 2010, a média da dívida soberana desses países saltou para 77% do PIB, tornando as dívidas da Grécia (143%), da Itália (100%), de Portugal (89%) e da Irlanda (78%) insustentáveis”.
Estes número não nos são estranhos pois várias vezes já apareceram em nossos artigos, mas algumas conclusões importantes o Professor aponta: “Países como Portugal, Espanha, Itália, Irlanda e Grécia, considerados menos competitivos, necessitavam de um período de 20 anos para realizar ajustes e reformas fiscais, tributárias, trabalhistas e previdenciárias e, desse modo, se adequarem ao projeto de moeda única. No entanto, a crise financeira global dos Estados Unidos atropelou o processo de consolidação da zona do euro”.
Este tempo de 20 anos em condições “normais” seria necessário, imaginemos agora de quanto tempo necessitariam?
A parte importante e relevante do artigo segue agora:
“Pouca atenção tem sido dada à maior dívida da região: a privada. Esta inclui a dívida das famílias e a das empresas não financeiras. Em 2007, ela representou 174% do PIB e, após a crise financeira dos Estados Unidos, em 2010, passou para 194% do PIB. A dívida privada da Itália equivalia a 122% do PIB e a da Grécia, a 105% – menores que a da Alemanha, de 131%. O fato é que, no período pós-crise financeira norte-americana, o acréscimo nas dívidas soberanas e privadas foi análogo: 20 pontos porcentuais.
Nos dias atuais, o nível médio das dívidas pública e privada somadas ultrapassa 300% do PIB da região. Esse montante é o principal limitador do crescimento do consumo, da poupança e dos investimentos futuros na zona do euro”. ( Grifo nosso)
Diante deste quadro geral de Crise pública e privada, o professor argumenta com precisão: “Há um erro crasso nas medidas de ajuste impostas aos países periféricos: os alemães exigem que os países em crise se reorganizem à imagem e semelhança da Alemanha. Os programas de austeridade fiscal equivalem ao ato de combater o incêndio com mais fogo. Os ajustes fiscais pedidos representarão empobrecimento rápido da região com aumento do desemprego, crescente movimento migratório para países fora da região, perda contínua de produtividade e crises políticas imprevisíveis”.
Ou seja, os resultados são exatamente o oposto do que a Troika espera, a tendência é aprofundar ainda mais o quadro de crise, tornar mais pobre e com menos competitividade os países mais afetados pela Crise, é mais ou menos a mesma conclusão que chegamos em artigos anteriores, agora consubstanciados por estes fortes argumentos.
As saídas apontadas por Ernesto Lozardo para questão do Euro, em síntese, é um recuo em relação à moeda única, acompanhemos:
“No curto prazo, pode-se amenizar esse cenário desfavorável, caso se adotem as seguintes medidas para os países periféricos: estabelecer um plano de saída do euro; efetuar a redução compulsória da dívida soberana e renegociação da dívida privada com a recapitalização ainda maior dos bancos com recursos do Banco Central Europeu (BCE); os países que deixarem o euro deverão retomar a sua moeda soberana, desvalorizá-la e ter o euro como moeda de referência; e reorganizar a atividade econômica com o apoio das instituições internacionais e regionais por meio de investimentos estruturais.
É fundamental que a Europa reconheça que o projeto de moeda única não é extensivo a todas as nações europeias. No médio e no longo prazos, deveria haver a centralização política e orçamentária dos países-membros, que inclui o processo de transferências fiscais intrarregionais, uniformização tributária e sistema bancário unificado e competitivo. Isso exige coesão política e fiscal”.
É um interessante ponto de partida ao debate, pois no fim aponta para outro caminho do futuro da União Europeia, que se busque uma composição política, depois fiscal, para se chegar a uma moeda única, dentro um espectro político federado ou confederado, para os países que venham a compor esta proposta. É a saída clássica de um Estado parecido com os EUA ou Brasil. Em Outubro de 2011, por coincidência, intuí este mesmo caminho ( Crise 2.0: Estados Unidos da Europa), hoje, pelo conjunto de animosidades, fruto da imposição alemã, não tenho mais esta certeza de que funcionaria. Ao debate.
Não entendo… não seria melhor que a UE estimulasse o desenvolvimento em todos os países periféricos e reduzisse a desigualdade, em vez de expulsá-los? Se é para ter uma Europa “de primeira” e uma Europa “de quinta” de direito — como de fato já temos — então que acabe logo a Zona do Euro toda, cada país com sua moeda e pronto.