Sobraram apenas cinzas e memórias.
“puluis et umbra sumus” (somos pó e sombra – Horácio)
Hoje apenas ando contabilizando a minha enorme perda em números:
5 anos e 10 meses
70 meses
2.100 dias
50.400 horas
3.024.000 minutos
181.440.000 segundos
Isso não diz o tamanho da dor e da miséria humana de uma partida de uma filha.
Assim, sou tomado por dois sentimentos contraditórios, daqui a dois dias Letícia faria 27 anos, no 20 de setembro. O primeiro é de enorme felicidade por todos os 21 anos, um mês e 29 dias em que ela nos deu tanto amor e graça e muitas vezes não sei se lhe demos a mesma retribuição de que mereceu à altura, nunca saberemos.
Em outra mão, no entanto, esses 5 anos e 10 meses foram os mais difíceis de nossas vidas, aquele enorme ciclo que nos envolveu, naturalmente vai diminuindo, ficamos apenas nós três, que vamos enfrentar para sempre algo maior do nós, o tanto que nos consumiu e ainda consome, uma marca que não apagará, nem depois dos tempos.
Naquela multidão de números temo que em algum momento, nem que tenha sido breve, esqueci do paradoxo que é viver depois disso tudo, muitas vezes como uma espécie de punição da vida, ou de um duro entendimento do que é a vida e de como ela existe para cada um de nós.
Claro que não queria ser soturno, mas sou, alguns dias mais que outros, as cinzas caem em mim, noutros, apenas a delicadeza do tempo, calor ou frio, seco ou úmido, dão cores e me reafirmam em mim, no averso do averso, da soma de contradições sem fim ou que tenha paz. Um dia transformar dor em prosa ou poesia.
Sigamos, ou não!
“Clear your mind, maybe you will find
That the past is still turning
Circles sway, echo yesterday
Ashes burning, ashes burning”
(Ashes Are Burning – Renaissance)
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