Arnobio Rocha Reflexões Palavras e Silêncio

591: Palavras e Silêncio


Palavras ao vento...

Palavras ao vento…

“A minha boca e a tua

Vão deixando pela rua

Palavras e silêncios

Que jamais se encontrarão”

( Zeca Baleiro e Fausto Nilo – Palavra e Silêncio)

Palavras soltas, girando e voltando na cabeça, sem pronunciá-la, apenas imaginadas, inevitavelmente me remetem ao meu livro mais amado, Hamlet, num trecho em que todas ou a maioria das palavras são soltas ou não fazem o menor sentido, a não ser para que as diz, ou que as escuta, um momento chave das palavras e da obra, leiamos

  • Polônio: Que é que o meu príncipe está lendo?
  • Hamlet: Palavras, palavras, palavras…
  • Polônio: A que respeito, príncipe?
  • Hamlet: Entre quem?
  • Polônio: Refiro-me ao assunto de vossa leitura, príncipe.
  • Hamlet: Calúnias, meu amigo. Este escravo satírico diz que os velhos têm a barba grisalha, a pele do rosto enrugada, que dos olhos lhes destila âmbar tênue e goma de ameixeira, sobre carecerem de espírito e possuírem pernas fracas. Mas embora, senhor, eu esteja íntima e grandemente convencido da verdade de tudo isso, não considero honesto publicá-lo; por que se pudésseis ficar tão velho quanto eu, sem dúvida alguma andaríeis para trás como caranguejo.
  • Polônio: (à parte) – Apesar de ser loucura, revela método. Não quereis sair do vento, príncipe?
  • Hamlet: Entrar na sepultura?
  • Polônio: Realmente, desse modo sairíeis do vento. (À parte.) Como são agudas, não raro, as suas
  • respostas! É uma felicidade da loucura, algumas vezes, felicidade que a razão e o bom senso não
  • alcançam com a mesma facilidade. (…)
  • Polônio: Passai bem, meu príncipe. (Retirando-se.)
  • Hamlet: Esses velhos cacetes e sem miolo!

Esta volta eterna ao ponto de determinada obra, em instantes cruciais da vida, uma certa aflição que nos atinge, o texto serve como bálsamo para aliviar a almas, recolocar no lugar a consciência, as incertezas, começam a se dissipar, não que elas sumirão, mas temporariamente esqueço. Releio mais algumas vezes o mesmo trecho, repenso, e me pergunto: como Shakespeare conseguiu ser tão engenhoso? O livro é pequeno, mas, é grandioso em praticamente todos os diálogos.

Concluo que são as Palavras, não as soltas(elas também), mas a reunidas, formam um todo, com poder, força, graça e algumas vezes, terrivelmente cruéis com a condição humana. No fundo ele é demasiadamente humano, a coragem de escrever aquilo que apenas imaginamos, que não ousamos dizer, falar, menos ainda escrever. Para passar mais palavras  e o consequente silêncio, uma música sobre elas:

Fagner e Zeca Baleiro – Palavras e Silêncio

[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=kJRNQeU6G4k[/youtube]

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