539: Nelson Rodrigues e o Teatro

 

Nelson Rodrigues, muito além do polemista,o grande autor de teatro

Como vocês já devem ter notado, quando me apaixono por um autor ou tama, não sossego enquanto não lhe ler a obra, me familiarizar com seus escritos, foi assim com Shakespeare, Dante, Goethe, Machado de Assis, Jorge Amado, Érico Veríssimo e tantos outros, não poderia ser diferente com Nelson Rodrigues, sua descoberta se deu por vias indiretas, não por seus livros ou colunas de jornal. As primeiras lições sobre ele era de que era um reacionário completo, mas escrevia bem sobre futebol, ou seja 1 x 1, isto por volta dos anos 80, mas naquela época não seria bom lê-lo.

 

Morando em São Paulo e trabalhando viajando por muitas cidades e estados do Brasil, era um problema andar com livros e revistas, mas dava um jeito, os pequenos de edição de bolso era uma saída, foi assim que tomei as leituras de Shakespeare, Homero e Teatro Grego. Quando estava em São Paulo podia ler os livros “grandes”, foi quando li a biografia do Nelson Rodrigues escrita por Ruy Castro, O Anjo Pornográfico, foi de um fôlego só, coisa de dois dias, fiquei encantado pela figura, a fatura tava desempatada, 2 x 1. Como estava enrolado com o Teatro Grego, não pude ir imediatamente ler a obra dele. Comprei a edição completa das peças teatrais, uma bela edição da Nova Aguilar.

 

Em 1995, durante uma palestra do mestre Junito de Sousa Brandão, o tema teatro grego e Nelson Rodrigues veio à tona, então resolvi ler suas peças, realmente o universo rodrigueano é riquíssimo, uma força incrível, a busca pelo humano, ou o mais fundo e escondido lado, que a nossa moral busca domar, nem sempre consegue. A coleção de tipos, sua profunda visão e construção psicológica é um marco no teatro nacional, talvez seja o nosso mais universal dos escritores brasileiros, seus personagens poderiam habitar a Grécia, a Itália, a Rússia ou o Rio de Janeiro.

 

Minha homenagem ao Nelson Rodrigues vem nesta linha, sua imensa contribuição ao teatro brasileiro, muitas vezes confundida com pornografia, erotismo, raramente lida e estudada no seu mais intenso campo, o debate moral, da psiquê humana. todos os ângulos do homem: sórdido, mesquinho, pervertido, neurótico são mostrados com força e maestria, sem se preocupar com costumes, valores morais da sociedade. As adaptações ao cinema de suas peças, em pornochanchadas de baixíssima qualidade, contribuiu para que a força e intensidade de suas obras fosse diminuída, apenas um aspecto, diria, o mais secundário, era explorado.

 

É o escritor mais revolucionário do ponto de vista de costumes, do Brasil, uma verdadeira contradição com o colunista reacionário. Uma rara sensibilidade, que a figura pública, com seus posicionamentos políticos, infelizmente, não deu sua real dimensão. O ambiente da ditadura, os conflitos abertos na sociedade, a tensão desta polarização, foi determinante para que o grande teatro de Nelson Rodrigues não tivesse o devido reconhecimento, muito maior do que tem, independente da figura política dele.

 

Dentre as peças, há pelo menos três obras primas: Vestido de Noiva, Bonitinha, mas ordinária ou Otto Lara Rezende e Perdoa-me por me traíres. São momentos espetaculares de um grande e único autor, com vasta obra, particularmente me interesso por seu teatro, outros suas crônicas do cotidiano e outros, ainda, seus escritos sobre futebol. O importante é lê-lo, conhecê-lo, jamais ignorá-lo por suas posições políticas.

 Save as PDF

Author: admin

Nascido em Bela Cruz (Ceará - Brasil), moro em São Paulo (São Paulo - Brasil) e Brasília (DF - Brasil) Advogado e Técnico em Telecomunicações. Autor do Livro - Crise 2.0: A Taxa de Lucro Reloaded.

0 thoughts on “539: Nelson Rodrigues e o Teatro

  1. Realmente, Nélson Rodrigues sempre foi citado positivamente por aquele intelectualidade que circulou nos bares de Ipanema e adjacências como uma pessoa respeitável.
    Meu conterrâneo Belchior em uma de suas músicas:”eu não posso cantar/como convém/sem querer/ferir ninguém”continue,colocando sua opinião ,como falei antes adoro tudo que escreves.

Deixe uma resposta