“puluis et umbra sumus” (somos pó e sombra – Horácio)
É que o FIM sempre nos assusta, no caso a morte é o último ato da vida e continua inescapável, que nem a Escatologia resolve ou dar paz aos que ainda estão em vida, pois a certeza da morte assusta e maltrata muito, senão a todos, a maioria se sente impotente e tomado pelo medo de morrer. Mas o que é o Fim? A finitude de cada um, ou de cada coisa? Por que esta ideia nos assombra desde os tempos mais remotos, em todo e qualquer época, povos, não importando o tempo ou lugar.
Estas reflexões volta e meia povoam os meus pensamentos, mesmo que procure me afastar delas, não tem como ignorar, passa longe e fingir que não exista. Neste sábado morreu José Wilker, grande ator, em primeiro lugar, além de muitas outras coisas que fez com muita competência, ao saber da notícia fiquei horas ali lendo ou ouvindo sobre ele. Os seus feitos eram louvados nos depoimentos dos amigos e colegas de trabalho, descontando os exageros normais, todos unânimes em reconhecer seu brilhantismo.
Aquela morte me deixou muito triste, pois além de gostar do trabalho de José Wilker, no começo dos anos de 1980 tive um professor de português que tinha sido colega de teatro de rua e militância política com Wilker nos anos de 1960 no Recife. Os dois eram muito jovens e participaram de muitos eventos históricos daquele momento especial, o governo popular de Miguel Arraes, as Ligas Camponesas, e as grandes figuras como Francisco Julião e Gregório Bezerra, então sabendo disto passei a admirá-lo mais ainda. Meu professor acabou trabalhando de novo com José Wilker na novela “Final Feliz” e nos contava de como ele não tinha mudado, mesmo já sendo artista de ponta na Rede Globo.
Mas o que me deixou mais pensativo foi saber, ontem, que Wilker teve seu corpo cremado, virara cinzas, do “pó viestes, ao pó voltarás”, a sentença bíblica que se cumpriu, ou seja, “Somos pó e sombra”. A ideia de finitude se consubstanciou no gesto final, a matéria vira sombra e ficamos apenas com as ideias do que foi sua existência. Parece muito pouco, para nossa existência, nossos desejos de eternidade, que só se cumpre, ou não, após morremos. Ou a lição de Alexandre Magno que pediu para ser enterrado com as mãos fora do caixão e seus tesouros do lado de fora, para nos avisar, que ficamos de mãos vazias depois de mortos, então não adianta acumular riquezas, principalmente as materiais, pois, para onde quer que formos, nada levaremos.
A poesia de Fernando Pessoa talvez nos ajude a entender a brevidade da vida:
“As rosas amo dos jardins de Adônis,
Essas volucres amo, Lídia, rosas,
Que em o dia em que nascem,
Em esse dia morrem.
A luz para elas é eterna, porque
Nascem nascido já o sol, e acabam
Antes que Apolo deixe
O seu curso visível.
Assim façamos nossa vida um dia,
Inscientes, Lídia, voluntariamente
Que há noite antes e após
O pouco que duramos”.
Por mais que tenha tratado a questão na morte, do fim, sempre parece a primeira vez.