
“Um novo arrais governa o Olimpo; Zeus exerce um poder arbitrário, inovando leis, e aniquila hoje os potentados de ontem”. (Prometeu Acorrentado – Ésquilo)
A Esquerda surgiu quando o Capitalismo se estabeleceu como o Sistema predominante tanto na Economia, como na superestrutura política-jurídica, com ruptura final do feudalismo, mesmo que de forma desigual entre países, às vezes dentro de um mesmo país, a dupla convivência dessas formas de exploração econômica.
A Esquerda (comunistas, socialista, anarquistas) e tem um papel fundamental na transição entre Sistemas, no estabelecimento das formas políticas de disputas e como resistência ao SISTEMA, na maioria das vezes lutando contra, mas sendo parte dele, não dissociada dele, ainda que o combata, diretamente ou indiretamente, o faz existir e o valida, quando não foi capaz (ainda) de romper com suas amarras.
As experiências do Leste Europeu funcionaram como paradigma e freio para que o capitalismo não experimentasse suas formas mais letais e destrutivas. A existência de um polo alternativo (com todas as contradições possíveis e imagináveis) de certa forma ajudou o capitalismo para se desenvolver enormemente, mas com limites.
Fez o SISTEMA aceitar (taticamente) algumas formas democráticas e a conceder direitos significativo para uma parcela da classe, não de forma gratuita, mas por pressões internas da luta de classes, como também temor de que o outro lado “vencesse”.
Nesse sentido, a adoção do Estado de Bem-estar Social em quase todos os países do planeta, algumas vezes com similaridade com o leste, a forte presença estatal na economia, planejamento, direitos sociais e trabalhistas, previdência, aposentadoria, educação e saúde, por um largo período, quase 80 anos (1929-2008), foi vencedor ideológico com o Leste Europeu.
A queda do muro de Berlim carrega um enorme simbolismo porque ali, todas as forças represadas se liberaram, um mundo quase unipolar surgiu, com o império dos EUA como senhor do mundo, mesmo a formação da União Europeia (UE) consolidada em 2001, não fez frente ao poderio de Washington e sua máquina de guerra e poder.
Uma nova ruptura se fez entre 2005-2008, a queda do muro de Wall Street, talvez a maior crise de superprodução de Capital da história, abriu a possibilidade de uma reorganização, ainda incompleta, do Capital, tanto econômica, quanto superestrutural.
A mutação de suas formas de exploração, o fim real do welfare state, criou um aparente vazio político, a Esquerda derrotada em 1989, não se ergueu ainda e não encontrou seu eixo, sua estratégia de ruptura ou mesmo de adaptação tática ao SISTEMA, ou mesmo a entender o que são essas novas formas de exploração e formas jurídicas, políticas de Estado.
Por outro lado, um novo Poder distópico, surreal, que se apresenta como antissistema, é uma força de ultradireita (internacionalista) que galvaniza a mágoa e a frustração de que não há mais Estado, nem Direitos, a culpa é da Política e da Democracia
Assim, ela se torna alternativa real, como se fosse questionar a Nova Ordem, de que luta contra o SISTEMA, olhando de perto, essas forças, no fundo, são parte essencial desse novo/velho Sistema, ela legitima todas as formas de superexploração humana, a uberização, a precarização, o fim do que sobrou de serviços públicos e as defesas dos mais vulneráveis econômicos, como são contra afirmações de raça, gênero e diversidade.
O que representam são os novos donos do Capital, uma parcela ainda menor e mais concentrada da riqueza, da ostentação, que não precisam mais de freios morais, éticos, de expressarem seu ódio de classe, suas vidas nababescas e disruptivas.
A alta tecnologia é o motor da mais catastrófica mudança da humanidade, é o veículo ideológico, político, de coesão e coerção, para uma hegemonia do Capital. Os algoritmos, a IA são fronteiras de quebra de paradigmas para formação humana, padrão cultural, educacional, na natureza, do clima, de soberania nacional e de unidades políticas autônomas.
A Esquerda que é tão fundamental para o gênero humano precisa renascer e se reafirmar como fonte de vida e dignidade, para que o planeta sobreviva ao caos, não é apenas a Barbárie que assusta, mas a escravidão não mais pelo contrato formal de trabalho, mas os grilhões tecnológicos, a dominação completa, vigiada e prisões digitais.
É um debate que se deve enfrentar, não como fim da Esquerda, mas como possibilidade de recomeço, para um cenário completamente diferente e desigual, em escala global.