Depois de 4 votações, nos dois primeiros dias de conclave, os cardeais optaram por mais uma “solução de continuidade”, elegeram o Cardeal argentino, Jorge Mario Bergoglio, assim como aconteceu na escolha de Ratzinger. Tudo que a igreja não queria, ou precisaria, aconteceu, elegeu um cardeal velho, 76 anos de idade, mas pior do que isto, de velhas ideais, com pesadíssimas acusações de ter colaborado com uma das mais violentas ditaduras da América Latina. Há um clima de perplexidade diante da escolha.
Todos os preparativos do conclave corria como voz unânime que a igreja precisava de “sangue novo”, afinal, Bento XVI renunciou justamente porque se sentia cansado e sem forças para enfrentar os desafios da Igreja, em particular a questão do Vatileakes, da corrupção e dos escândalos de pedofilia, sem contar a imensa divisão na cúpula com as correntes se digladiando pelo poder. Tudo isto estava em pauta, no início de março e foi debatido abertamente, o que levava a crer que um papa de menos de 65 anos seria eleito.
Volto ao texto Algumas das Razões da Renúncia do Papa, em que disse: “O espetáculo da sucessão papal começou oficialmente em 2005, pois o mandato de Bento XVI sempre foi considerado “tampão”, uma espécie de solução de continuidade em que os grupos antagônicos não tinham clara maioria, optaram por um nome que representasse um compromisso de manter as coisas como estavam, sem causar estragos maiores se qualquer lado assumisse, inclusive um cisma à direita. Esta é a leitura que consegui fazer à época, que se provou na prática, nestes anos. A opção foi bem pragmática, com 77 anos, saúde já abalada, o papado não seria longo, além do que a sua debilidade faria com que cada lado buscasse uma melhor localização para o novo confronto, 5 ou 10 anos numa instituição de 2000 anos não é nada, as correntes internas sabiam bem disto”.
E reafirmo, a igreja fez a opção para continuar sua sangria, com uma escolha para lá de ruim, o Cardeal Bergoglio já fora candidatíssimo em 2005, quando ainda tinha 68 anos, hoje aos 76 anos, não terá um longo mandato, as lutas internas continuarão, os problemas não serão enfrentados com a urgência necessária, assim como Ratzinger, lhe faltará energia e apoio. O seu nome é bem visto na cúpula, tido como bem relacionado e de muito diálogo. Porém, sua imagem, será lembrada pelas acusações de que colaborou com a ditadura argentina, com documentos oficiais sobre as suas ações.
Alguns lembram que Ratzinger militou na juventude nazista, não se deve ignorar, mas também há que se lembrar do ambiente do país, o estado em que vivia. Ao contrário, o Cardeal Bergoglio já estava em idade adulta, consciente e cioso dos seus atos durante os massacres da ditadura militar da Argentina ( matéria da Folha de São Paulo de 2005, Livro revela “dupla face” de papável argentino). A escolha é para lá de temerária, num momento mais do que delicado da igreja, se esperava algo mais do conclave, que na prática, apenas adiou por mais tempo qualquer solução contundente.
Será o primeiro papa Jesuíta, o primeiro Francisco, o primeiro não-europeu, uma série de ineditismo, mas, a mim, só me deu tristeza, pois é um recado ao mundo, não nos importamos com o que vocês pensam, só nos interessa a nossa igreja. Que assim seja.
Tristeza que não combina com você, sabendo o que sabe.
Arnóbio, sinceramente, dada a dimensão das crises (morais, econômicas, administrativas, de gestão e doutrina, perda de fiéis no mundo), não esperava que os problemas se resolvessem em 15 dias ou 3 meses. Mas me espantou terem escolhido justamente um dos piores, colaborador da ditadura sanguinária argentina. E francamente, uma possível influência nos governos progressistas latino-americanos não me parece viável. Os conservadores acham mesmo que um Papa que apoiou ditadura teria condições de ampliar a adesão de fiéis na AL? Ou dá para pensar que tenham escolhido, num momento em que a Europa vai de mal a pior, um “agente do capital internacional” ou da Cia? Acho que arrumaram um “agente” da Cúria com aparência de novo: latino-americano, jesuíta, de hábitos frugais, dizem. Para tudo ficar na mesma no Vaticano, enquanto eles quebram o pau lá.
“Tudo o que a Igreja não queria, ou precisaria, aconteceu”. Discordo de você, Arnóbio. A Igreja queria, e precisa, de mais um tempo de panos quentes, esperar a poeira baixar dos seus muitos escândalos atuais. Engana-se quem pensa que a Igreja será algum dia “progressista” ou coisa que o valha. Seus dogmas são muito precisos, segue-a quem concorda com eles. Assim como a Inquisição foi uma necessidade da Igreja na época, o combate às “modernidades” como ao direito ao aborto e ao casamento entre pessoas do mesmo sexo são necessidades da Igreja hoje. É a reafirmação de seus princípios. Mudá-los seria mudar o seu próprio sentido. Deixaria de ser a Igreja Católica Apostólica Romana, passaria a ser uma entidade secular.
Assino embaixo, decepção total; tudo como antes (ou pior) no quartel de abrantes, Brilhante o seu artigo.
Excelente texto. Concordo plenamente com o seu pensamento…. Ouso dizer que gostaria de ver na cadeira de Pedro alguém com um pensamento mais liberal, próximo do que foi João XXIII.Como é didícil ter essa fé e essa esperança!…