
A barba embranquecida e hirsuta, os poucos cabelos e raros cabelos, denunciam que o meu tempo passou, nem sei se para o bem, ou para o outro lado, apenas foi, assim como também fui. Na sala a TV rola um belo filme japonês, sem diálogos, Dias Perfeitos, Netflix, as músicas de velhos clássicos do Rock, as imagens de Tóquio (que me deram saudades), em contraste com o silêncio, meu e do filme, uma obrigatória reflexão de domingo.
A vida me deu mais do que poderia ser, de onde vim, talvez menos do que a imaginação/ambições, mas surpreendeu em tantas coisas e realizações, pequenas para o mundo, grandiosas para mim, sem qualquer ilusão, sem ufanismo. E, assim, vamos em frente, por quanto e até quando, sabe-se lá como e por quê.
Essa síntese que surge como resultante dos vetores tempo e espaço, de difícil assimilação, ainda que se compreenda a dialética, os velhos dilemas humanos perdem o sentido de urgência, por contradição, tudo é e foi para ontem, o que, de certa forma, pressiona e quase inviabiliza nossa pequena existência real, da experiência de tempo terreno.
As reflexões filosóficas elementares sobre quem somos, ou de onde viemos, para onde iremos, sofrem alterações e mutações, tornando tensa a percepção do papel que a humanidade cumprirá nos próximos anos, décadas, como se tudo fosse ser resolvido no tempo presente/corrente por algoritmos e simulações da potencialidade do cérebro, a última fronteira humana.
Hoje sinto que o ritmo do meu tempo é frenético, ele voa assustadoramente, dias, semanas, meses e anos, ainda que, por outro lado, a dinâmica interna é de desaceleração, lentidão própria do corpo. É como se esses dois vetores tensionem cada um para seu lado, para que se defina meu ser, vençam essa luta complexa do que é a vida, pior, a consciência de que o maior caminho foi percorrido e a estrada não é mais longa.
O filme de Wim Wenders, com o espetacular, Kōji Yakusho, me trouxe a esse lugar, a esse domingo, apenas mais, ou menos, um dia.
