“Com isto se fechou a noite da minha tristeza, tramontou o sol da minha felicidade, perdi o lume dos olhos e do entendimento” (D. Quixote – Miguel de Cervantes)
Olhando para tela vazia do notebook, sem letras e palavras, veio uma estranha sensação de que ali se reflete o mesmo sentimento que há em mim. Depois de anos e anos com uma vida intensa e de grandes realizações pessoais e profissionais, a vida enveredou por caminhos tortuosos, sem que encontre uma saída digna para vencer essa situação complexa.
Aqui escrevi muito sobre muitas coisas e sobre o nada, as lutas políticas, os embates ideológicos, as dores da vida, sofrimentos, emoções, choros e músicas, os prazeres e gostos, sobre as vaidades, diletantismo e o encontro com as coisas simples da vida, as amizades, as referências e reverências, as celebrações e momentos sombrios.
Falar de si é uma dificuldade, um alto risco, diria. O maior dos riscos é de não se ter nenhuma humildade, ser dominado pela vaidade e/ou ser egocêntrico. Claro que não se busca a empatia fácil por piedade, nem mesmo a se mostrar as marcas e feridas de guerras para encontrar aplausos e solidariedade. Penso que sou alguém meio Coriolano, mesmo entendendo que muitas vezes temos que nos expor, quem não é visto não é lembrado.
Atingi o meio da jornada, entre a loba e o leão, na selva escura, sem nenhuma certeza do porvir, nenhuma segurança e nem mesmo garantia do dia seguinte, isso é literal. Por mais que tenha feito e lutado por uma futuro melhor, o presente tem sido duro demais, as mudanças e as adequações profissionais ainda não se efetivaram ou trouxeram resultados, é um fato.
Alguns abalos sofridos nesses últimos anos causaram estragos em todos os campos da minha vida. É como se eu navegasse de uma tragédia à outra, sem muito tempo para que a tempestade desse trégua para ter alguma estabilidade, ao contrário, a tormenta é sempre mais alta, o cérebro não para, não descansa de uma luta, passa para outra, apenas ônus, sem bônus, um recado mental de que é o que sempre seremos:
Sobreviventes!
Especialmente, esses quatro anos tão pesados, desde a partida de minha filha Letícia. Todos os dias em que a ordem é sempre acordar e viver mais um dia, segurar a onda e seguir, quase sempre à deriva, de uma saudade descomunal e dolorida. Olhei para as outras tragédias em volta e quem sabe fugir da minha, ou amenizar o que se sofre, mas não tem arrego, algumas vitórias, animadoras, que logo se transformam em nada.
Uma nota vem à mente, o problema está consigo, não em outra pessoa, ou lugar e de que apenas em si pode ter uma saída.