“Até bem pouco tempo atrás
Poderíamos mudar o mundo
Quem roubou nossa coragem?
Tudo é dor
E toda dor vem do desejo
De não sentirmos dor.” (Legião Urbana)
O ano de 1989 é carregado de simbolismos e que tantas vezes vamos tratando por aqui, como forma de reviver e ao mesmo tempo expulsar os espíritos maus daquele louco ano. Nem sempre é fácil remontar o dia a dia de algo que não terminou, por muito tempo vamos ter que reencontrar o que foi perdido ou esquecer de vez.
Dois livros, em especial, marcaram aquele ano: A insustentável Leveza do Ser (Milan Kundera) e Os filhos da Rua Arbat (Anatoli Ribakov). No meio de intensos debates políticos, no pequeno Coletivo Gregório Bezerra, em que respirávamos marxismo, aquele grupo era conhecido como “ratos de livros”, tínhamos que fazer jus à fama conquistada na esquerda militante. Mas encontrei um tempo para devorar esses marcantes livros.
Alguns anos depois, vi o filme baseado na Insustentável Leveza do Ser, mas jamais retomei a leitura da continuação dos Filhos da Rua Arbat. A perspectiva das duas obras, contra o stalinismo e a aberração do “socialismo real”, de certa forma, também serviu como alerta do que estava por vir, não apenas em 1989, mas principalmente depois, o que reflete até hoje em toda a esquerda.
Para alguns, o saudosismo tolo, uma nostalgia da antiga URSS, uma glória perdida, quase esquecendo todos os terríveis crimes stalinista e degeneração ideológica. Para outros, o ódio velado, ao processo histórico, porém não concluído com a esperada “revolução permanente”, caiu o leste e nada aconteceu, do ponto de vista dos trabalhadores, não ouvi a revolução contra a restauração. Mesmo assim, não houve uma revisão daqueles que se pretendiam herdeiros eleitos pós-muro.
O Legião Urbana com o álbum, “As Quatro Estações”, fez um disco incrivelmente sintonizado com o momento. Era uma ruptura e maturidade do grupo, os discos anteriores eram mais politizados e engajados com as mudanças do país, com o mundo e com as ruas, refletia os momentos finais da ditadura, da constituinte e do Brasil que estava por surgir.
Neste disco tudo era diferente, o tom é de reflexão, distanciamento, ouvindo hoje, parece que ele é o disco que representa um ano que não se fechou. É quase profético, pois, a fluidez ideológica posterior aos 1989 é bem descrita naquele registro. O individualismo, as relações menores, em oposição aos movimentos coletivos.
É fato que várias profecias não se cumpriram, as principais: “o fim da história” e a diluição dos conflitos de classes. Mas também há que se registrar, que passados 27 anos, cada tijolo do muro, ainda espanca nossas costas, tortura nossa alma, impede que nos reconstruir ideologicamente. Muitas vezes a melancolia se impõe ao voltar ao 1989, raramente é com frescor, a dor ainda se mantém, as feridas continuam abertas.
Até quando vamos viver 1989?
Legião Urbana – Quando o sol bater na janela do teu quarto
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