As recentes pesquisas sobre o Governo de Dilma e as expectativas eleitorais de 2014 nos colocam, mais uma vez, diante do debate sobre qual a relevância da Economia na Política e vice-versa. De cara, já aviso, defendo o primado da Economia sobre a Política e sobre qualquer outra ordem de análise. Então, antes de entrar na questão proposta, vou retomar um artigo do mês passado no famoso “Outono brasileiro”. Nos últimos dois anos tenho me dedicado aos estudos da Economia Política mundial, retomando Marx, sob a Categoria Crise 2.0, escrevi mais de trezentos artigos que foi melhor sintetizado no meu livro Crise Dois Ponto Zero – A Taxa de Lucro Reloaded. Partindo da Crise no Centro (EUA e UE) e seus reflexos no Brasil, que trato no Capítulo dedicado ao BRICS.
Aponto diretamente, sem embargo, que por volta de Julho de 2010, o Brasil, efetivamente, passou a sentir com mais força os efeitos da Crise, as políticas anticrese adotados entre 2008 e 2010, ainda no Governo Lula, foram fundamentais para que o país não sucumbisse à hecatombe mundial, entretanto, o fôlego destas medidas não seria tão longo, caso a economia mundial não se recuperasse, o que realmente não aconteceu, ao contrário piorou. Assim descrevi, no livro:
“A aposta de Lula, seguida por Dilma, era de que EUA ou UE superariam a crise em três ou quatro anos, o que parecia plausível naquele distante novembro de 2008. O Brasil então soltou às amarras da economia para crescer e aguardar que um novo ciclo se iniciasse. O que percebemos é que o auge deste processo se deu até julho de 2010 – o ciclo virtuoso começava a ter problemas. Com a paralisia do mercado mundial, a inflação ameaçava o crescimento interno. Em agosto de 2010 começou lento processo de ajuste, uma tentativa de acomodação “suave” do Brasil diante da crise. Percebia-se que a crise econômica mundial seria mais longa. Os EUA e (muito menos) a Europa não davam sinais de que retomariam o ciclo virtuoso. Ao contrário, os constantes QE (expansão da base monetária) exportavam a inflação do centro desenvolvido para o mundo, o que dificulta em muito os ajustes locais”.
“Dilma recebeu o governo em situação bem melhor que a de Lula ao suceder FHC, mas sob turbulência mundial muito maior, na qual a crise na Europa, por exemplo, apresenta cenário de recessão longa. Os EUA, com sua tímida retomada, não garantem um novo ciclo de crescimento, principalmente porque a ameaça passou a ser Zona do Euro. São dois anos de voo baixo, lutando a duras penas para não pousar de vez. Ainda assim os resultados no Brasil são significativos, como o mercado de trabalho em expansão”.
Por fim disse que “A resposta, agora, parece clara: sim, a Crise 2.0 chegou aqui, por volta de agosto de 2010, mas o Brasil não vergou, o que é muito, muitíssimo. Mesmo num cenário pessimista como o da OCDE, o Brasil não recuará, mas o nível de compreensão e apoio terá que ser maior, muito maior”.
Partindo desta análise e da realidade concreta podemos melhor entender os fatos e fados apresentados pela grandes manifestações, pois estão diretamente ligados à queda de expectativas na Economia em geral e particular no âmbito das ações governamentais, aqui entendida como responsabilidade, quase que única, do governo central, o que de todo não é errado, os ônus e bônus são assim melhor distribuídos. No texto anterior apontei os três signos da revolta: “1) A Crise passou a ser sentida, em particular nas classes médias e alta; 2) A tolerância com os governos do PT, era graças a sensação de estabilidade econômica, então agora os graves erros da época do Mensalão, acabou; 3) Todo o ódio de classe, mesmo que difuso se liberou”.
Acrescentei ainda que “Mesmo com os números da economia em ordem, a sensação de que algo não vai bem se generalizou, o maior sintoma é na Inflação, que passa a pressionar o governo que caminhava firme na política de diminuição dos juros, mas recuou diante do velho fantasma, mesmo que de pouco vulto, ainda assombra. As várias desonerações e planos e mini-pacotes de combate à crise acabam trazendo poucos resultados palpáveis, combinado com uma péssima comunicação do que se está a fazer. As medidas acertadas de diminuição do preço da energia e os impostos da cesta básica foram espertamente incorporados ao lucro dos supermercados, sem que o governo reagisse”.
Hoje a jornalista Maria Inês Nassif escreveu interessante artigo que reforça exatamente o que venho escrevendo, “Queda nas expectativas para o futuro é anterior às manifestações de rua”, entre outros dados que ela analisa a pesquisa da CNT, que tem uma fidelidade maior pelo método de aplicação e repetição, ao contrário da do DataFolha que tem um viés bastante discutível. Mas o que de fundo a jornalista diz é que “Uma variação eleitoral tão abrupta deve ser atribuída ao efeito contágio das manifestações que ocuparam as ruas do país e as redes sociais no período. Todavia, se forem considerados os indicadores de expectativas dos entrevistados para os próximos seis meses da 113ª Pesquisa (de junho de 2012) e da atual, é possível chegar à conclusão de que a corrosão das expectativas era parte de um processo que antecedeu as manifestações, e podem ajudar a entender a razão de manifestações com reivindicações tão difusas e variadas terem adquirido uma força de contágio tão rápida e tão grande”.
Ou seja, as questões vinham se avolumando, as manifestações apenas devolveram o PT e o Governo Dilma ao seu patamar fundamental, que é cerca de 33% do eleitorado, que segue o partido de forma sistemática, independente da conjuntura e des seus desdobramentos, os ganhos ulteriores eram frutos de dois bons governos que soube enfrentar as tempestades, além de apresentar sólidos ganhos à maioria da população, mesmo diante de uma feroz oposição midiática os números da economia servia de capa protetora. Com a reversão destas expectativas, o olhar mais pessimista quanto à economia, é absolutamente normal que haja este deslocamento, não significando a perda definitiva do apoio.
O Voto é o ato consciente que se faz, em regra, com “estômago”, quem quiser refazer os caminhos da democracia, não apenas no Brasil, mas também no mundo, verá que a questão se reverte de força. Apenas para ilustrar, TODOS os governos europeus foram derrotados nas urnas devido a imensa Crise 2.0, independente do verniz político, mesmo Merkel, com situação alemã melhor que a dos demais países, não terá uma reeleição tranquila. Obama venceu por margem extremamente apertada, mas um pequeno “sopro” de melhora da economia acabou sendo determinante para que ele obtive o segundo mandato.
Mesmo com toda esta queda geral dos números de apoio ao Governo e a Presidenta Dilma, ela ainda é favorita, continua em primeiro lugar, venceria todos os candidatos num segundo turno, e lembrando que Lula, que não é candidato, venceria no primeiro turno. A situação é bem complexa, não desesperadora. Entretanto, o “Outono brasileiro” deveria servir como alerta geral, não apenas ao PT, mas principalmente a ele, de que é preciso aprofundar a democracia, tornar o governo mais próximo, voltar a discutir política, não se deixar levar apenas pelos ventos da Economia.
A mesma Economia que deu dois mandatos a FHC e lhe tirou o governo em 2002, punido pelo apagão e péssimo segundo mandato, pode também fazer com o PT volte à planície. Há tempo para mudar o rumo, mas Política e Economia devem andar lado a lado, pois só a segunda, já não lhe garante a vitória. PT deveria voltar a fazer política, ouvir, repensar seus quadros e rejuvenescer, como fala o ex-presidente Lula, tem que se reinventar, este novo momento, precisa de novas ideias e novos interlocutores.
Leu isso? http://blogoosfero.cc/tie-brasil/tie-brasil/o-pib-cresce-4-ao-ano
Excelente, Arnóbio. Parabéns. O PT não pode e não deve se acomodar. Quanto ao link que Giovanni recomendou, já tinha lido, surpresa, vindo de um tucano é bom sinal.
Beleza, tem que se reinventar e RÁPIDO!