“O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!”
(Versos íntimos – Augusto dos Anjos )
Meses atrás fiz uma análise do último filme do Batman ( Batman: Capitalismo ou Barbárie?), tem um apanhado dos três da série de Cavaleiro das Trevas, um Batman sombrio, atormentado pela culpa, pelo ódio, que sobrepõe o Estado de Direito, com a condução de sua vingança social de caráter privado. É uma visão típica dos ultraliberais, Tea Party, de que Franl Miller é simpatizante. Aqui no Brasil, Globo, Veja, Folha e Estadão compartilham desta mesma lógica de liberalismo sem limite ético, político ou humano.
A escalada da grande mídia do Brasil, na busca de um “herói” à la Batman, para “vingar” a sociedade contra o velho estado ( representado pelo PT), na imposição do Estado Gothan City (Crise 2.0: O Estado Gotham City ), ultraliberal, sem qualquer amarra ou compromisso com a sociedade, menos ainda com os miseráveis e mais pobres, uma radicalização na ideologia do desprezo à qualquer sombra de humanismo que um dia iluminou a burguesia nascente. A “escolha”recaiu , por azar, em Joaquim Barbosa, pois estava em seu poder um tiro decisivo para desmontar o PT, o processo do dito “Mensalão”.
Joaquim Barbosa, entrou para o STF pela mãos do ex-Presidente Lula, dentro de um processo de ampliar a representação na suprema corte, não apenas de correntes de pensamentos jurídicos, mas também que contemple a diversidade do país, até então representada por Homens, brancos, em sua imensa maioria vinda de famílias ricas, como se ali fosse algo à parte do restante do país. Desde cedo, Joaquim Barbosa não foi digerível, um preconceito velado, a irritação de ser uma espécie de “Cotista”, esquecendo sua belíssima carreira jurídica e qualidades intelectuais. Dentro do próprio STF, em seguidos conflitos, ele ficou isolado, vide caso contra Gilmar Mendes, um dos queridinhos da mídia.
Lembro ainda, devido a diversos problemas de saúde, Joaquim Barbosa se afastou do STF, já como relator da peça do “Mensalão”, foi vítima das revistas semanais acusando-o de não ir ao trabalho, mas frequentar o chorinho e tomar cerveja nos bares, como se o problema de coluna impusesse a ele um retiro social. A malícia era pressioná-lo ou a largar ou apressar a peça de que era responsável, projeto tão caro e decisivo aos anseios midiáticos. Quando do entrevero Joaquim x Gilmar, foram unânimes em condená-lo como rude, grosseiro, o que faria ali na corte suprema, sempre carregando num sutil preconceito.
Joaquim Barbosa, próximo a ser Presidente do STF, por tradição o rodízio a cada dois anos, coincidiu com o início do julgamento do mensalão, as vozes na mídia e nos sites especializado, de advogados e juristas, era de que ele não deveria assumir, melhor romper a tradição a deixar um bruto ser o Presidente da corte. Nas redes sociais, nas redações as notinhas, as insinuações anti-Joaquim, cessou quando ele assumiu a tese da condenação cabal de todos os acusados. Partindo de uma tese extremamente perigosa, de condenação por “domínio dos fatos” Joaquim liderou a ampla condenação dos réus, o que modifica a jurisprudência de forma radical, se realmente for seguida nos próximos julgamentos.
Por vias tortas, o “rejeitado” Ministro Joaquim Barbosa, virou o “menino pobre que mudou o Brasil”( por Veja), o Batman, o vingador da sociedade e tantos epítetos que se somaram. O herói da mídia se consolidou, naquele momento, sua “eleição” à Presidência, foi, digamos, “tranquila”. Os mais afoitos, mesmo nas redes sociais, enfiaram o rabo entre as pernas e engoliram o “Batman”. Mas, parece, que só foi na aparência, o dia seguinte estava sendo preparado, veio com mais rapidez do que esperava.
Sabedores da animosidade de Joaquim Barbosa, rapidamente começam a testá-lo, uma notinha aqui outra ali, apimentada por uma dose de malícia, como a de Sonia Racy, sobre a namorada de 24 anos de Joaquim que segundo a colunista termina assim a sua coluna: “Quem a conheceu atesta ser ela inteligentíssima”. Dias depois, após reunião no STF, um jornalista do mesmo Estadão, que cobre a corte, tentou fazer perguntas ao ministro, que nervoso, diz que não tem o que falar com ele, que fosse “chafurdar no lixo”. Pronto, a fera, ameaçada, ataca, era tudo que eles queriam.
Hoje, passado o furacão da morte de Chávez, o Estadão foi ao ataque, não em defesa de seu jornalista( “O fato de a vítima da truculência do ministro ser um repórter deste jornal é irrelevante”, mas pela queda de Joaquim Barbosa, com direito a Editorial, o espaço “nobre” dos donos do jornal, com o título “Lamentável Truculência”, desanca de forma direta, depois de elogios de praxe pelos serviços prestados no julgamento do mensalão, veio a sequência de porradas:
“Contudo, diante do peso do desafio que se coloca diante do ministro, as reiteradas manifestações de descontrole emocional de Barbosa tornam-se muito preocupantes. Já durante o julgamento do mensalão, transmitido ao vivo e acompanhado por um enorme contingente de brasileiros, em várias ocasiões o então ministro relator tratou com impaciência e descortesia os pares que se opunham a suas ponderações. Mais de uma vez, viu-se obrigado a se desculpar. E a maior parte do público sempre assimilou esses deslizes com alguma tolerância, até porque era testemunha do padecimento físico que um problema crônico de coluna impunha ao ministro”.
E não para por aí, editorial dá ultimato: “Se não se sente em condições físicas e psicológicas para manter um comportamento público compatível com a dignidade dos cargos que exerce, Joaquim Barbosa deveria deles se afastar.” Antes de terminar, para despista quem quer realmente a saída do ministro,o editorial acusa que o destempero de Joaquim Barbosa “foi recebida com escandaloso regozijo, nas mídias sociais, pelas viúvas do mensalão, interessadas em desacreditar o principal responsável pelo desfecho da Ação Penal 470, em proveito dos dirigentes partidários condenados à prisão pelo crime de comprar apoio parlamentar para o governo Lula”.
Se há viúvas ou não do Mensalão, não lembro de ninguém exigindo o afastamento de Joaquim Barbosa, mesmo discordando de sua tese jurídica, do seus ataques de histeria. A questão é que agora, o Ministro se tornou irrelevante para seus antigos “admiradores”, o trabalho prestado, agora é esquecido, volta à carga a demonização, ou seja, de Batman, Joaquim, será transformado em Coringa. Sem a menor cerimônia, até o plano B de uma possível candidatura anti-PT, parece descartada, o personagem não é confiável.
A Contradição ou a ironia do Duo, Batman/Coringa, como descrevi no texto sobre o herói morcego: “Numa frase lapidar do filme dois, o Coringa sendo interrogado na prisão por Batman é bem direto: “Você e Eu somos foras da lei, não reconhecemos nenhum limite, somo iguais”. Aqui começa a problema conceitual de Batman”. A mídia que o criou o destruirá, sua personalidade irascível ajuda na desconstrução.
Aguardemos.
Só faltou dizer: serviço prestado, volta a senzala. Parabéns pelo artigo.
Excelente artigo do Arnóbio. Me impressiona como a velha mídia ficou previsível e a serviço de organismos sinistros.