“Morrer – dormir – Dormir!
Talvez sonhar. Aí está o obstáculo!
Os sonhos que hão de vir no sono da morte
Quando tivermos escapado ao tumulto vital
Nos obrigam a hesitar: e é essa reflexão
Que dá à desventura uma vida tão longa”
(Hamlet – W. Shakespeare)
A vida é uma série de acontecimentos aleatórios, surpreendentes (ou não) bons (ou não), cuja única e inexorável certeza é que tem fim, pois a morte é o fim de quem vive, fisicamente, para os que acreditam em outras hipóteses, mesmo nelas, esse RG e CPF, se apagam. Por essas incertezas, os humanos, aparentemente os seres mais evoluídos (em tese), criaram deus, deuses, deusas, seres extraordinários (as), muito acima de nós, para que fossem benevolentes com nossas jornadas, apagando nossos desacertos e, quem sabe, dando-nos uma vida ulterior, uma escatologia melhor e duradoura, noutras, vingamos uns aos outros, com o fogo eterno, pois daquela morada ninguém jamais voltou, como diz o bardo inglês.
Nessa jornada de incertezas, exceto aquela fatal, vamos trilhando caminhos próprios e que quase sempre são tortuosos e doloridos, eventualmente com momentos intensos de felicidade e bons augúrios, que de tão rápido não percebemos e não aproveitamos plenamente, mas também é parte de nós e de nossa interação com o mundo, cuja vontade individual é (deveria ser) a busca pelo coletivo, pelas possibilidades de que aquilo que conseguimos pudesse ser o comum a todos e todas, obviamente que isso não é regra, pois o espelho é voltado para os pouquíssimos bilionários/trilionários, cujo fim será o mesmo daquele que ganha 1 real por dia.
A aventura humana é extremamente curta diante do tempo da Terra, esse planeta tão aleatório, assim como foi a forma de onde surgimos, de onde viemos, e sem sabermos para onde vamos, principalmente pelo grau destruidor que descobrimos ter, a capacidade de ruptura da existência com uma hecatombe à mão, fruto de nossa imensa sabedoria, para bem ou para o mal, mais pelo segundo do que pelo primeiro. Mesmo ela, a sapiência, não nos elevou aos melhores graus de consciência e de entendimento de que nosso destino poderia ser melhor, no entanto, pelo andar da carruagem, nada nos fará escapar do fim coletivo, o individual, repito, é certo.
O papel que cumprimos no mundo, valores e padrões civilizatórios estão cada dia menos relevantes, aceitamos a derrocada humana como algo natural, inescapável, então procura-se esvaziar o que se conseguiu por alguns milhares de anos, tornando a vida algo insuportável, miserável materialmente e de ideias, utopias e perspectivas, como se viver dignamente, para que todos tenham direitos, não passe de uma teimosia, de pessoas chatas, que insistem na possibilidade de remar contra a maré.
Azedo estou, não posso negar, o que se explica pelo, talvez, peso (idade, ou cinismo) do meu próprio tempo que se esgota, com uma quase certeza do fracasso (pessoal e coletivo) de que poderíamos mudar o mundo, mas não fizemos, ao mesmo tempo, insistir em teimar e resistir de toda forma, sem se entregar ao comum e ao elementar, nem mesmo a aceitar o porvir e se entregar, para apenas contemplar o caos., isso também faz parte da vida e de nossas reflexões mais “maduras”.
Assim vamos e voltamos ao ponto, por quanto mais?
Senão porque o terror de alguma coisa após a morte –
O país não descoberto, de cujos confins
Jamais voltou nenhum viajante – nos confunde a vontade,
Nos faz preferir e suportar os males que já temos,
A fugirmos pra outros que desconhecemos?
(Hamlet – W. Shakespeare)