“Os filósofos têm apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo” (Teses sobre Feuerbach – Marx)
O que é ser marxista hoje?
Essa pergunta venho me fazendo, seguidamente, todos os dias há pelo menos 32 anos, precisamente após a queda do leste europeu, em particular a derrubada do muro de Berlim, que levou junto toda uma geração de militantes, obrigados a reverem suas concepções políticas, ideologia, sonhos e utopia, ou no mínimo a questionarem as suas convicções históricas.
Por volta de 1991, deu-se o fim da URSS e com a certeza de que a queda do muro de Berlim não significaria uma “nova revolução”, como sonhavam os trotskistas, muito menos que Gorbachev/Yeltsin seriam um novo alento ao socialismo real, como chegamos a pensar, a esquerda entrou em crise geral, no mundo.
Aqui, no Brasil, não poderia ser diferente, a crise foi mais acentuada pela baixa formação política e intelectual proporcionada pelos partidos e grupos marxistas aos seu militantes. O momento de debacle poderia/deveria servir para uma profunda reflexão não apenas sobre a experiência do leste, mas sobre que tipo de sociedade efetivamente nós buscávamos.
Naqueles duros anos iniciais dos anos de 1990, vários de nós, em pequenos grupos e círculos intelectuais, voltamos aos estudos dos clássicos, não apenas os escritos de Marx, mas de toda a tradição humanista, especialmente a ocidental. Fomos revisitar os filósofos gregos, os cânones literários, as fontes únicas do pensamento humano.
Era preciso debater Marx e sua interpretação da Economia Política, os conceitos centrais de uma ideologia posta em xeque. Buscar compreender os significados das experiência das revoluções, a russa, a chinesa e a cubana, como também as várias formas de tornar as teses de Marx de transformação social, em ação revolucionária e de ruptura do Capitalismo.
Por quase 20 anos o neoliberalismo reinou soberano, mesmo com as várias crises, com o aumento das desigualdades e da exploração. Parte da Esquerda se adequou à real política, por pragmatismo e/ou sobrevivência, houve a maior negação de Marx de todas as épocas, o que se refletiu no abandono até das lutas elementares burguesas, como a da reforma agrária e urbana.
Apenas com a Crise de 2005-2008, Marx é recolocado no centro do debate, mesmo que em negação, mas a teoria das Crises voltou ao centro das preocupação, de todas as forças politicas.
O capitalismo entrou em crise sistêmica com força de cataclisma, como acontecera em 1871 e 1929, parcialmente entre 1974 e 1982, as economias centrais foram abaladas, abriu-se uma época de revoluções, que sem partido e/ou movimento de massas, não houve força para derrubar o sistema, mas liberou novas forças para o futuro.
A importância de Marx está exatamente no Método de análise e a Teoria do Valor, na compreensão ampla da Economia Política, na reafirmação, como ordem de pensamento urgente, a Revolução, a ruptura com a sociedade classes. A luta de classes, tão negada pela direita e por parte da esquerda, segue sendo o termômetro da correlação de forças da sociedade.
Pensar Marx hoje é ter capacidade de compreender as contradições do Kapital e apontar saídas, entender que o velho proletariado fabril, pode não está num mesmo espaço físico, mas sua exploração e sua mais-valia continua vital para a produção de Valor.
O infoproletariado, o uberizado, o precarizado, o sem terra, o sem teto, as classe médias urbanas, constituem a imensa maioria da sociedade e o Kapital não apresenta mais políticas compensatórias que amorteçam as imensas contradições. É claro que falta o amálgama, a política que os unam e possam derrotar o Kapital, o elemento subjetivo está adormecido, ainda sofre o peso da derrota recente, 30 anos é muito pouco tempo na história.
Continuo estudando e pensando ideologicamente como marxista, mas não saberia definir como é ser marxistas hoje.