“interrompem em inúmeros pontos a cadeia das obrigações de pagamento em prazos determinados, e se agravam com o consequente desmoronamento do sistema de crédito que se desenvolve junto com o capital. Assim redundam em crises violentas, agudas, em depreciações bruscas, brutais, em estagnação e perturbações físicas do processo de reprodução e, por conseguinte, em decréscimo real da reprodução” (Marx, Capital, L-III, V-IV, p. 292)
Semana passada, Temer, sentindo a lâmina da guilhotina no pescoço, gritou no Twitter: “Acabou a Recessão”. Esse é um debate importantíssimo, sobre a questão da Crise (recessão) que vai muito além da fanfarronice de um Golpista moribundo tentando não morrer. É um tema recorrente que proponho nesse espaço, com baixíssima repercussão, o que traduz o abandono da esquerda pela compreensão da Crise e suas implicações na Política.
No meio do desatino de Temer, há uma verdade, pois é fato que as principais tarefas vitais para recomposição da taxa de lucro foram cumpridas, a saber: Queima da Forças Produtivas, eliminação massiva de emprego, corte de direitos sociais e trabalhista, adoção de terceirização ampla, que leva à precarização do emprego, com queda dos salários e renda. Além da transferência de riqueza (Privatizações, quebra do pré-sal) do Estado para as grandes empresas, perdão de dívidas.
Diante de todas essas medidas e com uma base de análise extremamente rebaixada, com queda do PIB por oito trimestres seguidos, sem contar na mudança de critérios do IBGE para apurar as estatísticas, óbvio que o corpo começa a responder, com saúde frágil, com todos os riscos de quem ainda não saiu da UTI. A crise política sem dúvida coloca em xeque a pequena recuperação ou sua extensão.
Do meu lado, entretanto, acredito que não existe crise terminal, muito menos crise permanente, ainda que não recupere agora, sem ruptura com o sistema, o ciclo do Kapital se imporá, cedo ou tarde. Aqui é o centro da questão, ou entendemos o caráter das Crises do Kapital, ou viveremos por espasmos, com concepções que chegam à crendices religiosas, como se o Kapital não se recupere ou não cresça mais.
Quando escrevi a série sobre a Crise 2.0, uma das primeiras tarefas foi retomar o conceito de Crise em Marx (Crise Dois Ponto Zero – Conceito de Crise). A questão era nos afastar do marxismo vulgar que entende formalmente Marx e trabalha com conceitos de crise terminal e/ou crise permanente. Alguns chegam a afirmar que o Kapital acabou pois não há mais produção de Valor, ou mais-valia.
A primeira parte do nosso livro, Crise Dois Ponto Zero – A Taxa de Lucro Reloaded foi feita para demarcar campos de análise e buscar, em Marx, o entendimento da crise atual sem cair no simplismo de que era apenas mais uma crise ou de que era a última. A maior importância deste entendimento é para não sermos pegos de “calças curtas” quando acontecesse a recomposição do Kapital. É fato que a crise não acabou, mas alguns elementos de retomadas já estão presentes.
Aliás, a razão fundamental da queda dos governos petistas é que objetivamente ele não cumpriria integralmente as tarefas acima descritas. Apenas um governo com total comprometimento com a agenda destrutiva do Kapital e sem nenhum compromisso com a povo pôde levar à cabo um programa tão nefasto. Concordemos ou não, o programa do Kapital, nessa época histórica é esse, aqui ou nos EUA, aliás, a UE claudica nos últimos 10 anos por não ir à fundo nessa agenda.
É óbvio que temos elementos de barbárie, pois há restrição sempre maior dos dos ganhos dos despossuídos ao mínimo necessário para sua reprodução, além da restrição à Democracia e Política, também tratamos esses fenômenos aqui, mais recentemente em O Mundo Grávido da Barbárie. Os elementos fundamentais de um Novo Estado, que carinhosamente chamo de Estado Gotham City, se impôs como realidade global.
Agora nos afastamos da análise de que vivemos em Estado de Exceção, na verdade é o contrário, virou Regra, sendo a Exceção o velho Estado, aquele com Democracia e com Política. Esse é um outro desdobramento da Crise 2.0, que mais uma vez convido ao debate.