Desde a queda do Muro de Berlim, o mundo tem passado por experimentos laboratoriais de modelos econômico-político e sociais de redução da Democracia e da Política. Estas receitas respondem às novas demandas do Kapital para ampliar a níveis jamais vistos a exploração e a concentração da riqueza. Há um número mais restritos de grupos e famílias que dominam o Kapital, representam, ao mesmo tempo, o esmagamento dos setores de classes médias urbanas e dos trabalhadores.
A nova ordem se impôs com a defensiva dos trabalhadores e de suas organizações com a derrota dos regimes do Leste, ainda que deformados politicamente, eles davam ao mundo uma polarização que permitiu uma força excepcional aos sindicatos, movimentos sociais e partidos de esquerda e centro-esquerda, em todas as partes do planeta.
Aquele período glorioso da luta de classes deu ganhos reais e efetivos aos trabalhadores e suas condições materiais melhoraram de significativas nas principais economias mundiais, que se materializava nas conquistas do Estado de Bem-estar Social, forma dominante existente, assim como na representação política e nos regimes democráticos burgueses.
A riqueza material e a formação de imensas classes médias urbanas e extratos intermediários davam uma estabilidade e, por outro lado, amortecia, de alguma forma, as lutas de rupturas com o Kapital.
O fim da polaridade representou as “mãos livres” do grande Kapital para mudar radicalmente a sua forma de apropriação da riqueza, o Estado já não precisava distribuir ou funcionar como compensador das distorções sociais e econômicas, as suas funções foram paulatinamente diminuídas. Consequentemente a Democracia e a Política entram em crise, pois não representam mais perspectiva de melhoria e/ou mobilidade social.
A promessa de estabilidade econômica sem a guerra fria, pois acabara o “império do mal”, não haveria mais crise e a própria história teria seu fim. A ideologia ultraliberal passa a incentivar o individualismo radical, a “meritocracia” como forma de enriquecimento material, sem ética ou qualquer preocupação social foi a tônica principal dos anos de 1990 e início dos anos 2000.
Até que uma velha conhecida do Kapital veio para desmentir essa pretensa estabilidade, a Crise 2.0, que bagunçou a vida no planeta. A extrema instabilidade mundial gerada por volta de 2008 teve todos elementos de crise de poder, porém a classe trabalhadora e as classes médias não tiveram força para se contrapor ao Kapital, o que levou a um recrudescimento do sistema capitalista mundial.
A resposta dramática à Crise 2.0 feita pelo elemento mais dinâmico do Kapital, o Kapital financeiro, foi o ataque generalizado contra qualquer indício de políticas públicas ou sociais do Estado. A criminalização das atividades políticas e por conseguinte da Democracia. A radicalização dos conceitos neoliberais dos anos de 1980/1990, impôs as piores condições de vida e de participação política da sociedade, dos 99% contra o 1% que a domina.
A maior vítima dessa escalada é a Democracia, mesmo a mais incipiente já não é tolerada. Criou-se um simulacro de Democracia que não passa de uma farsa de representação e de eleições puramente formais.
Lado a lado, a esse processo, de ocaso da Democracia, temos a demonização da Política, não basta criminalizar os atos políticos, é preciso destruir os seus principais atores, passando assim, a ser exercido por canastrões de filme B (Trump, Temer, Dória etc). O que levou a “civilizada” sociedade francesa a dar 10 milhões de votos a extrema-direita, neofascista. Ou a Grã-Bretanha romper com a UE numa campanha dominada pela extrema-direita.
A via principal escolhida para quebrar Democracia e a Política foi a judicial, para dar um ar “legal” a tragédia. Os personagens são demonizados, vistos como ladrões, bandidos, se tornam presas fáceis para campanha sincronizada de mídia e judiciário. Os exemplos abundam em todas as partes do mundo, aqui no Brasil, o governo de centro-esquerda, desgastado, foi derrotado finalmente por uma farsa patética.
Mas não satisfeitos, as principais lideranças são caçadas em processos de dá inveja aos “processos de Moscou”. Para não ter dúvida, quanto à farsa, vimos graves acusações via PowerPoint com convicção, sem que se precisasse de qualquer prova. As delações como único método para se investigar, com imposição enormes penas e/ou prisões preventivas sem fim, apenas para negociar as famigeradas e arbitrárias delações premiadas.
Mais além, a singular e reveladora pergunta do juiz-justiceiro a Lula que queria saber por que o ex-Presidente recebia deputados no Planalto, como se isso se caracterizasse como ação criminosa, ou servisse de base de prova. O Presidente exercer sua atividade essencial, a Política, é algo proibido ou ilegal. Como se os acordos e as negociações políticas fossem crimes, claro, desde que esse Presidente, seja de Esquerda. Todos os dias se lê que o Golpista recebe em nababescos jantares a base parlamentar e nomeia por apoio, sem ser admoestado.
Esse tempo sombrio, lembrou-me do que o filósofo Agamben disse em Atenas, novembro de 2013, “a democracia e a política estão em extinção”, porém, ”não sei o que é esse novo regime que surge”.
Poucos de nós se atreve a nomear o inominável, apenas constatamos o CAOS.
Não se preocupem com o nosso futuro: os camelôs que Lula e Dilma chamaram do Haiti salvarão o Brasil.