1400: Da Escrita e das Vaidades.

Pouco, ou quase nada, levaremos para sempre, o resto é silêncio.
“E, sobretudo, isto: sê fiel a ti mesmo.
Jamais serás falso pra ninguém”
(Hamlet – William Shakespeare)

Escrever é exercer o desconforto.

Então é muito mais fácil ler do que escrever, pois, assim, podemos viajar pelas ideias e pelas imagens maravilhosas que os poetas, os mestres das letras nos fazem seguir. Ao escrever, uma linha que seja, estaremos nos expondo, trazendo à luz nossas mazelas, eventualmente nossa graça, pois é fato que bem poucos efetivamente têm o dom do encanto e da magia.

Os enormes conflitos morais e éticos são as nossas primeiras barreiras que precisaremos vencer, ainda que seja delicioso simplesmente nem lembrar deles. Entretanto, raramente nos livramos dessas paralelas que nos colocam para seguir rumo ao caminho do centro, assim como o lutador de sumô que não pode sair do dohyō, esses valores lutam conosco, no imaginário círculo.

Avançamos na aridez de poucas ideias e/ou na busca tensa de encontrar as letras, as palavras mais precisas que possam exprimir o que sentimos. Que elas representem nosso amor ao que defendemos e sobre o que pensamos com mais intimidade, visto que não é possível, para mim, apenas amontoar frases perdidas para causar efeitos, sem que elas falem sobre mim, do que sou de verdade.

Esse é o risco, a nudez que somos submetidos ao tentarmos escrever. Por mais que busquemos as folhas de Adão e Eva, estamos sem nada, preparamos a nossa armadilha fatal. Como vivemos com roupas e camadas que nos protegem, raramente nos acostumamos a ficar despidos, não é uma intimidade de quatro paredes, mas andar num meio de algumas pessoas, algumas vezes dezenas, não é simples.

Perigo maior, no entanto, corremos, se formos nos preocupar com o juízo que farão de nós, os pequenos ódios, a inveja, esse mal tão (des)humano que ninguém se livra de carregar. Tudo isso faz parte de nós, portanto, escrever é fechar os olhos para o que dirão de si (projetando em nós), ou então não siga em frente. Nenhum grilhão pode nos aprisionar.

Muitas vezes os conselhos de Polônio ao filho, Laertes, pululam na minha cabeça e mãos ao passar pelo teclado, acabam sussurrando: “Não dá voz ao que pensares, nem transforma em ação um pensamento tolo”.

A literatura vai nos moldando a criar nosso próprio método, pois “até a loucura, tem um método”. O caminho pelo qual seguiremos, como uma bussola para nos guiar, desviando de penhascos e desfiladeiros, todavia sem se iludir de que estejamos seguros, posto que escrever (viver) é sempre perigoso demais. Ninguém vive ou escreve impunemente.

Ao escrevermos saímos da zona de conforto ao mesmo tempo que a sentimos a tentação de exercemos nossas vaidades, quem sabe as nossas ilusões, alguns sonhos bons de que estamos fazendo algo bom, muito além de nós Mesmo que no fundo não vá passar de uma miragem feito as bruxas de Macbeth, que se “desmancham no ar, como nossos anelos” 

 Assim, é, se nos agrada.

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Author: admin

Nascido em Bela Cruz (Ceará - Brasil), moro em São Paulo (São Paulo - Brasil) e Brasília (DF - Brasil) Advogado e Técnico em Telecomunicações. Autor do Livro - Crise 2.0: A Taxa de Lucro Reloaded.

1 thought on “1400: Da Escrita e das Vaidades.

  1. Escrever nem uma coisa
    Nem outra –
    A fim de dizer todas –
    Ou, pelo menos, nenhumas.
    Assim,
    Ao poeta faz bem
    Desexplicar –
    Tanto quanto escurecer acende os vaga-lumes.
    Manuel de Barros
    Dedico a vc, desculpe a intromissão.

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