A questão que mais distinguia a Esquerda, até 1989, era a Solidariedade, a despeito das enormes diferenças entre nós e até mesmo com os adversários, um militante político de Esquerda, tinha a obrigação moral e revolucionária de ser companheiro, camarada e solidário com o outro. Nas piores situações, no cárcere, por exemplo, esta qualidade inata de qualquer homem de esquerda, despertava a admiração e o respeito de todos.
Infelizmente, o que percebo e o que sinto é que após a queda do Muro de Berlim, a nossa derrota não foi apenas política e ideológica, mas principalmente no aspecto humano, da nossa formação mais especial que se traduz na Solidariedade. As várias correntes de Esquerda que, politicamente, definharam e ainda definham, nestes últimos 25 anos, com suas rupturas cada vez mais sem sentido, a autofagia selvagem, nos levaram ao abandono deste princípio norteador de um revolucionário, para com seus camaradas e para com o povo.
Além do rebaixamento político das divergências, com o empobrecimento ideológico dos militantes, o distanciamento dos estudos elementares da teoria, que muitos dizem professar, um componente desagregador maior nos foi imposto, pelo modo de vida do Kapital e pela nova realidade ideológica, o abandono dos camaradas em situações precárias, ou o isolamento político daqueles que se afastam por divergências. Estes movimentos são complementares, conscientes ou não, os agrupamentos políticos (alguns parecem seitas milenaristas) acabam por tornar a militância política num fardo pesado demais, principalmente nos momentos de embates e divergências.
Os militantes que se afastam politicamente dos partidos ou grupos políticos passam a ser hostilizados e estigmatizados por suas diferenças, estas são secundarizadas, privilegia-se a destruição do quadro político, do medo que ele “contamine” aos demais com suas posições. Toda a tradição de embates e bons debates, mesmo que chegassem a grandes rupturas históricas, sempre aconteciam em cima de posições políticas ou ideológicas, com diferenças claras de táticas ou estratégias, jamais se davam com isolamento de pessoas, mas num contexto político maior.
Uma nova militância forjada nos escombros do Muro de Berlim, em particular esta última das redes sociais, são caracterizadas por relações extremamente frágeis, voláteis, “líquidas”, pouca dada a divergência e diferenças políticas, a vaidade pessoal se impõe à qualquer projeto maior(se existir). Uma parte de velhos militantes, incluo-me nestes, que enxergaram na internet e nas redes sociais, com milhares de possibilidades de falar e ouvir com amplitude, são tomados por uma decepção tremenda com a pouca ou nenhuma paciência para o debate, para a formação política, parece que todos já sabem TUDO e não precisam conhecer mais NADA.
O que torna pior é o extremo individualismo egoísta, pois deu o tiro de morte naquilo que nos unia, nos piores momentos de refluxos ideológicos, a Solidariedade, ainda que separados em grupos divergentes, os debates eram intensos, as pautas exaustivas. O que se percebe, hoje, é que se um blogueiro discorda de outro e escreve um post crítico de debate, ou se isola completamente ou vira motivo de chacota de patotas, sem jamais debaterem o fundamental, apenas “neutralizar” o “divergente”, de forma ampla, Facebook, Twitter, etc.
Esta formação de uma militância ultraliberal que, apenas na aparência, lembra uma política de Esquerda, mas que no fundo não há coerência ideológica nenhuma, nem mesmo de confronto com o Kapital, apenas nos aspectos secundários, numa busca de “Liberdade”, que na maioria das vezes é apenas egoísta, que de nada difere de grupos como o Tea Party, que também confronta o Estado Burguês, gritando por mais “Liberdade”. Este individualismo, o isolamento atômico, como se tivéssemos respostas globais, leva a recusa ao debate ou a formação de organizações totalizantes, como os partidos, tornando presa fácil ao curso do Kapital, aliás, impulsiona-o, por não combatê-lo em sua totalidade.
PS: Aqui, neste pequeno espaço, continuarei a semear a Solidariedade, os velhos sonhos, a busca de uma nova Utopia, na medida de nossas forças, com exemplos práticos, com encontros com pessoas e de vida, como fizemos neste fim de semana, Lufeba, Ricardo e Eu.
Um texto necessário e, por que não dizer?, reconfortante. Há vida ainda, apesar de tudo.
Fiquei muito contente com o encontro de vocês no Rio, saber que Felipe está bem. A relação humana é insubstituível.
cid cancer
Belíssimo artigo, Arnobio! A Solidariedade é, mais que um sentimento, uma necessidade, uma estratégia de sobrevivência.
É mais um aspecto da luta de classes. Ô luta infinda…