Os últimos filmes da Marvel e da DC Comics são verdadeiros espetáculos, pois têm uma união de criatividade, inventividade, tecnologia com ótimos roteiros, que são extremamente atuais e que em muito refletem sobre o momento da realidade mundial. Neste aspecto, a Crise atual do Kapital, tem lugar especial em cada história, o que aumenta em muito nosso interesse em conhecer os roteiros paralelos, que vão muito além da aventura a que se propõe e que cumprem tão bem, trazem uma série de debates tão importantes.
Aliás, é um verdadeiro privilegio acompanhar passo a passo a atual Crise do Kapital, que denomino como sendo a Crise 2.0, com grande esforço teórico sistematizamos as análises no nosso livro Crise Dois Ponto Zero – A Taxa de Lucro Reloaded, cujo centro é a volta ao Marx, o único pensador que conseguiu analisar com extrema precisão os ciclos e a crise de superprodução do Kapital. A parte mais original do nosso livro foi a de levantar a tese de que surge um novo Estado que se gesta desta Crise, o Estado Gotham City.
O cinema dos EUA contribuiu em muito com nossa visão sobre para onde caminha o mundo, o que propõe o Kapital como futuro para sociedade humana organizada, pois estes filmes são carregados de ideologia e realidade. Nossos artigos sobre os filmes da Trilogia do Batman, o Cavaleiro das Trevas, em Batman: Capitalismo ou Barbárie? foram fundamentais para que escrevesse o capítulo final do meu Livro Crise Dois Ponto Zero – A Taxa de Lucro Reloaded. Mais além, no artigo Batman vs Bane ( O Gigante Coxinha?), verificamos as relações do discurso de Bane que virou a base ideológica das “revoltas” no mundo, o que coincidiu(igualou) os desejos do Tea Party com “Novo”, os indignados, o ultraliberalismo que namora a barbárie.
Com o novo Capitão América (Capitão América 2 – o Soldado Invernal), temos novamente os EUA, aqui Washington, naqueloutro (Vingadores), Nova York como cenários do caos, assim como é o cenário de Gotham City, a simbologia é a mesma, o diálogo entre Marvel e DC Comics não é por acaso, no final voltaremos ao tema. Steve Rogers parece deslocado no mundo moderno, o ambiente em que lutara, a Segunda Guerra, pela nova ordem mundial, contra o Nazi-Fascismo, pela liberdade, e democracia, ele acabou por não vivê-lo, pois estava congelado, perdeu os seus melhores momentos. Agora, Steve Rogers, saiu de uma Guerra, a Segunda, diretamente para uma nova era, que volta a ameaçar o mundo e por tudo aquilo pelo qual o herói lutou.
A NSA, digo a SHIELD, dominada por um conselho autônomo, que independe dos políticos (Presidentes Eleitos), vive apenas da vontade dos burocratas e da doutrina de segurança, prepara uma nova e destruidora arma, que partindo de um novo algoritmo analisa o DNA dos possíveis terroristas (esquerdistas?) que põem em risco à ordem mundial. Os seres humanos são catalogados e poderão ser dizimados, sem qualquer prisão, interrogatórios ou processo legal, todo este “enfadonho” e moroso sistema legal, que , segundo esta ideologia dominante, atrapalha a “paz mundial”, ou nas palavras do chefe-geral do Conselho, Alexander Pierce (Robert Redford): “O que são 20 milhões de potenciais alvos, diante de 7 bilhões de cidadãos?”.
O herói vive num outro mundo e não entende como se processa a dinâmica da “não-Política”, o que aparentemente se nega os políticos, mas a burocracia, que é parte da política, a mais nociva, é que determina quem vive, quem morre, vigiando os passos de cada um(alguém lembrou da NSA?). A ordem destes burocratas é mais sofisticada, seletiva, com o controle e repressão direta a qualquer pessoa ou grupo, que pode ameaçar o funcionamento da sociedade “livre”. As palavras chaves de Steve Rogers, soam melancólicas e saudosistas, ligadas ao velho Estado: a primeira, ao conhecer o projeto insight, “não foi para isto que lutamos pela liberdade”. A segunda frase, mais significativa “saudade do tempo que eu apenas seguia ordens e servia (ao meus país)”.
O Novo Estado que emerge dos escombros da antiga ordem, entra em choque com os heróis ( Batman ou o Capitão América), estes como representantes de uma mitologia própria, agora vivem em conflito tanto internos com o que sobrou da velha ordem, sua lógica, mais ainda em contradição ao que nos aguarda. Novamente recorremos ao que nos conta Rogers, de que é mais fácil lutar “quando se sabe contra o que e contra quem”. Esta mesma angústia, dos heróis, são sentidas por todos nós simples mortais, pois se nem estes seres, que se colocam entre nós e o divino, não têm certeza do por que lutar, quanto mais nós?
Este mundo em rápida transformação, outros acham lento demais, traz um ambiente de incertezas, ansiedade e medo. Tudo isto facilita as manipulações, muitas delas partidas de necessidades reais de cada país, que são cientificamente trabalhadas no ideário das pessoas comuns, para provocar mais ódio às instituições do velho Estado, carcomidas pela corrupção e ineficiência. O cenário leva à dispersão social, enfraquece a Democracia, mais um elemento a ser destruído, pois se tornou um estorvo e atrapalha o avanço do novo ciclo de produção.
É este o mundo, cada dia mais estranho e mais complicado de compreender, de se organizar. Estes filmes são espelhos exatos, do que vivemos.