896: O Palhaço o que é?

Pequeno Circo, cada vez mais raros.

 

Escrevi sobre o filme “Cine Holliúdy”(Cine Holliúdy, O Cinema da Minha Infância) e mais uma vez a sensação de ter sido “arremessado ao passado” (apud Eduardo Goldenberg), realmente é esta a vontade, lembrar de fatos e pequenas(grandes) felicidades vividas numa época tão distante, mas cheia de significados, que nos fez moldar nossas personalidades. O cine improvisado, as ruas de calçamento, a troca de postes de iluminação ou aquela TV na praça, que vi no meio do “chuvisco” da imagem o Corinthians campeão em 1977.

Bela Cruz, minha terra, meu torrão natal, se enchia de vida durante a semana da festa do caju, ou na semana da festa da padroeira. Mas de vez em quando era sacudida com estes eventos luminares, como a ida do cine, mas ainda quando chegava um Circo na pequena cidade. Aquilo era um colosso, a molecada em bando ficava farejando o Circo, o que eram as “atrações”, se tinha animais, trapézio, acrobata. Ora, uma trupe desta para chegar à distante Bela Cruz, não podia ser grande, era sempre muito simples, pobre, mas trazia a felicidade.

Para nós o importante mesmo eram os palhaços, o resto era o complemento, nisto era certeza, Circo pequeno se construía em torno dos palhaços, suas tiradas e piadas, quase sempre imorais, impublicáveis, mas que nos matava de rir. Quando muito, aquelas companhias, aqueles heróis levavam uma bailarina bonita ou a moça que acompanhava o mágico nos enchia de paixão. Era maravilhoso quando tinha trapezistas, as mulheres principalmente, geralmente era família, pai, mãe e filhos adolescentes, víamos aquilo de saltar no ar, o medo de algo acontecesse e as palmas nervosas.

Os circos eram montados bem perto da minha casa, na entrada da “Estrada do Barro”, perto do posto do Seu Benedito. A noite nos reuníamos cedo, para pensar um jeito de entrar, quase sempre não tínhamos dinheiro da entrada, mas a “segurança” do circo era bem frágil, quando o pessoal já estava naquelas arquibancadas, o pessoal afrouxava a vigilância, facilitando que os moleques menores entrassem escondidos, ou ficasse “brechando” pela cerca, quando a lona era curta. Muitas vezes não dava certo, então ficávamos ouvindo as piadas que ecoavam daquelas caixas de som, até isto era divertido, nem precisava entrar.

Aqueles homens com a cara pintada nos traziam não apenas risos, mas também fantasia, suas estórias engraçadas, quase sempre se dando mal, os diálogos bem ensaiados, as presepadas, jamais saem da memória. Nos dias seguintes imitávamos entre nós. Muitas vezes sabíamos de co e salteado as falas, as situações, mas ríamos animadamente, batíamos palmas empolgadas, era nosso reconhecimento, nosso imenso agradecimento por eles.

Uma arte que se perdeu no tempo, minhas filhas não curtiram ir ao circo, tinham medo dos palhaços, mesmo em festas infantis, uma pena. Também os circos de hoje não tem nada de fantasia, de lúdico, de humano, as companhias são “profissionais”, o que não diferencia de ver ali ou na TV. Minhas memórias ecoam as musiquinhas, as cambalhotas e a pergunta chave: “O palhaço o que é?”, que respondíamos gritando: “ladrão de Mulher”.

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Author: admin

Nascido em Bela Cruz (Ceará - Brasil), moro em São Paulo (São Paulo - Brasil) e Brasília (DF - Brasil) Advogado e Técnico em Telecomunicações. Autor do Livro - Crise 2.0: A Taxa de Lucro Reloaded.

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