Hiroshima
Estar em Hiroshima é uma experiência das mais estranhas que se possa sentir, o Shinkansen foi se aproximando da cidade e uma sensação de dor, amargura foi tomando conta de mim, era por volta da meia noite, depois de um dia muito especial em Ise, a terra mais sagrada dos xintoístas, e um fim de tarde maravilhoso andando sem rumo por Nagoya.
Saímos de Nagoya rumo a Hiroshima feliz por andar de Shinkansen mesmo sendo noite apreciamos as paradas e nos divertimos pela viagem, porém nosso destino era lá, acabara de ler um livro de Kenzaburo Oe e a “guerra” ainda rondava minha cabeça.
Ao chegar à estação central rapidamente peguei um taxi e fui ao hotel, um mesmo Sun Garden que morava em Kashiwa, já quebrou um pouco do temor pela cidade nova, tentei dormir logo, mas o incomodo não deixava, não era cansaço, era a aura da cidade, a carga emocional.
Monumento pela Paz Mundial
Consegui, a muito custo, dormir, acordei muito cedo, encontrei meus amigos passamos numa lanchonete comemos alguma coisa e partimos para o Domo, o local que os americanos miraram ao jogar a bomba atômica, que os japoneses fizeram questão de preservar seus escombros. O Domo era a cúpula de uma fábrica de armas, pela maquete que vi depois, era o único prédio de concreto armado da cidade. Em 1996, 51 anos depois da explosão o nível radioativo perto do Domo ainda é acima do normal, há equipamento que mostram os valores instalados em volta.
Logo ao lado dele há o imenso museu, a praça, a catedral ecumênica e a pira da paz mundial sempre acesa pela paz, para que nunca mais se jogue novas bombas. Entramos no museu, é um prédio longo de três ou quatro andares, em que tudo relacionado ao ataque americano está preservado lá: fotos, objetos, o artefato que carregou a ogiva, uma réplica do Domo, representação dos corpos dilacerados.
Ao entrar há vários monitores de TV em que você escolhe entre 128 idiomas para que seja detalhadamente contado o dia do ataque, e suas conseqüências malditas, por exemplo, ao tocar o solo e liberar a explosão 20 mil pessoas morreram imediatamente em pouco mais de 30 minutos, o calor no epicentro da bomba chegou a oito mil graus, num raio de 20 km ceifou a vida impiedosamente 200 mil pessoas.
As lágrimas e a sensação de dor aumentam gradativamente, um silêncio sepulcral toma conta do museu, nem entre nós encontramos palavras para dizer o que sentíamos apenas nos olhávamos e todos choravam, não há o que falar, é refletir toda maldade humana daquele gesto cruel, quem entra neste museu não saí igual, a dor é imensa, o repúdio à bomba e aos americanos toma conta.
A sabedoria japonesa transformou aquele local terrível em poesia, um lindo e imenso labirinto de jardins foi construído em frente ao museu tendo à esquerda o monumento da esperança cheio de feixes de Origamis em homenagem a garota que viveu 1000 dias mesmo gravemente doente, pois o médico lhe dizia a cada Origami você ganhará um dia de vida(pausa para lágrimas). De todo lugar do mundo as pessoas mandam os feixes de origamis que são respeitosamente depositados em frente ao monumento.
Pouco mais à frente a Pira que nunca apaga, ela deve ser sempre acesa para que nos lembremos do mal da bomba, das pessoas mortas, do flagelo humano, que reflitamos sobre nossas escolhas e vida, as pessoas chegam perto da pira sentem o calor, se iluminam e saem silenciosas.
Deste conjunto arquitetônico também faz parte a catedral pela paz mundial, ela não pertence à religião alguma, mas qualquer que processe alguma fé, ou mesmo quem não tenha religião vai prestar sua solidariedade aos mortos da imensa tragédia, os soluços, os cantos, as orações em várias línguas são ouvidas, o pensamento é único.
Toda e qualquer coisa que escreva dirão pouco do que foi a visita a Hiroshima, muito difícil expressar, parei várias vezes aqui lembrando as coisas e chorando, um nó na garganta, uma coisa em particular marcou muito, nenhum de nós conseguiu bater fotos de lá, nada se capta numa foto nossa ou do lugar, talvez inconsciente fosse nossa maneira de respeitar o lugar e as pessoas, entramos em Hiroshima cheio de si, saímos pequenos de nós, envergonhados pelo que fizemos a nós mesmos.
Rosa de Hiroshima
(Vinicius/Gerson Conrad)
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada
Arnóbio, que experiência fantasticamente triste! Acho fascinante poder estar em Hiroshima, ver com os próprios olhos o que a estupidez humana é capaz de fazer; a força destrutiva da ganância.Adoraria poder ir até lá, apesar de não estar bem certa de que teria coragem suficiente para ver tudo isto sem me envolver no sofrimento que tais lembranças acarretam, até para quem, como eu, teve a sorte de nunca ter vivido nada semelhante, de nunca ter perdido parentes e amigos numa tal situação. Imagino como deve ter sido para você esta viagem, que acredito inesquecível, como inesquecível foi a bomba quedizimou populações inteiras de cobaias humanas.
Mais uma vez, parabéns por este blog fabuloso.Nota dez!!!
Estive lá.O querer do poder politico,comercial,terras, nada explica a razão de querer destruir milhares de vidas como foi Hiroshima.
Como DEUS deu força para essa gente levantar uma cidade marcada pela destruição.Parabens aos japoneses que até hoje , dão exemplo no mundo de respeito, educação, organização e força de vontade.