E naquele sono da tarde de sábado de feijoada, em que não se divisa, realidade e sonho, desejos e fantasias, me vem a filha que partiu, que me liga e não consigo atender, sem que lhe veja o rosto, o sorriso, mas era ela que me chamava em desespero, de que estava perdida numa cidade ou bairro e eu pronto para lhe ajudar a se achar, ou até mesmo me encontrar.
Talvez reflexo de um filme visto, “Caranguejo Negro”, futurista, catástrofe, a mãe que tem sua filha tomada, uma situação de guerra, para não mais saber dela. Não é a mesma história, mas a mesma perda, de não mais saber sobre os nossos bens mais preciosos, nosso sentido da vida, filhos ou filhas, que não deveriam ser tirados de nós.
Em vários momentos, nesses três anos e meio, de pensamentos confusos, situações incertas, a vida sempre imprecisa, fui tomado por ideias, ou por necessidades, de voltar no tempo, nem que fosse por alguns segundos poder ouvir, abraçar e ver minha pequena, mesmo sabendo que não há mais nenhuma possibilidade, nem mesmo ilusão religiosa.
É um vazio que vamos preenchendo com outros vazios, para que a vida passe e que, de alguma forma, possamos viver com dignidade, pois temos mais amores aqui, que nos fazem continuar, com todas as contradições que a vida nos trouxe e aprontou conosco.
Cada um de nós vai encontrando pequenas soluções de continuidade, para perseverar, ainda que a dor nos machuque, alguns dias, mais que em outros.
Ah, quanta falta, saudade.