Conhecia o lado de fora prédio velho do Hospital Santa Catarina, no começo da Avenida Paulista, desde muito tempo, costumava andar por ali, sem pressa, tenho conta no Bradesco, vizinho ali desde 1989. Olhava aquelas paredes com as gravuras em bronze afixadas na lateral e suas mensagens, muitas vezes apressado nem imaginava como me ligaria aquele prédio, muito tempo depois. A visão é imponente, uma praça interna e a bela capela chama atença, mesmo de quem passa rápido, sem se deter para admirar.
Muitos anos depois estive ali para visitar amigos que ali tiveram filhos e também para atendimento no pronto socorro do hospital. Mas, em todas as vezes, antes de 2010, era coisa rápida, atendimento, espera no PS, um Raio X, ou uma espera maior para um especialista. Como trabalhava ali perto, algumas vezes me socorri do atendimento deles. Sem maiores demoras, a não ser quando fiz 10 sessões de fisioterapia de uma entorse no pé. O que me obrigou a ir mais vezes lá num espaço curto de tempo.
Porém, em 2010, quando minha filha começou a sentir dores, tinha ido a outro hospital, depois num especialista, ortopedista, pois achávamos se tratar de problema na coluna, nada resolvido, no dia 11 de junho daquele ano, resolvemos levá-la no Santa Catarina, quem sabe um clínico geral não indica alguns exames e um especialista mais apropriado, era esta ideia. Por uma coincidência, o plantonista era residente em oncologia e ao ouvir a descrição do caso, pediu um hemograma completo urgente. Bem o resto desta historia já escrevi aqui (#Leucemia : Quando ela bate na sua porta! ).
Mas foi dali que partiu uma relação mais forte com o Hospital Santa Catarina, de amor e ódio, bem não propriamente assim, não tenho/tive ódio ao hospital, na verdade da situação que passamos. Ficamos de 11 de junho à 27 de agosto, frequentando, morando naquele local. Conhecemos vários quartos na internação pediátrica, pois a cada 15 dias tínhamos que mudar, até UTI estivemos, o longo tempo lá me fez conhecer cada alameda daquele hospital, ver seu ritmo, das pessoas que entravam e saiam, de olhar para o nada, esperar, esperar.
Os vários locais de exames ou profissionais, os que trabalham na parte de sangue, com certeza conheci todos, foram, naquele período, 110 exames de sangue, uma infinidade de transfusões. Os de Quimioterapia também, os médicos, enfermeiras, nutricionistas, porteiros, atendentes, parecíamos íntimos em nosso calvário. Até as freiras que lá vivem, descobri isto passeando no jardim com minha filha, que lá tem uma espécie de convento. Um jardim e casas internas, com pássaros e animais, que são inimagináveis para quem passa apenas em frente ao complexo hospitalar.
O prédio antigo por fora, mas todo modificado por dentro, novo, nem parece o que se vê lá na rua, o jardim em estilo oriental, zen, com pedras e bem cuidadas plantas. A belíssima capela, linda, mas assustadora internamente, é escura, sufocante, pois que está num hospital, já está aflito, ali parece que amplifica seus medos. O amplo salão de entrada, com iluminação natural um grande piano, que muitas vezes era tocado por alguém que estava ali visitando parentes ou amigos. O movimento intenso do caríssimo estacionamento e seus manobristas.
Neste tempo todo consegui finalmente, olhar uma a uma as gravuras, mas confesso, não consegui naquela época e agora digerir o significado real delas ali, parecem dar um ar grave ao ambiente, uma certa lembrança e imagens da idade média, de antigas instalações não apenas hospitalares, mas dedicadas a outras práticas mais duras, como tortura, amplamente usada pela igreja contra seus “inimigos”. Precisaria ir com mais calma e definir sobre o que significa, que mensagem carrega.
“Painel do Hospital Santa Catarina
Em substituição às antigas janelas do térreo do bloco B do Hospital Santa Catarina, localizado na avenida Paulista, em São Paulo, foram instaladas 24 placas de bronze, de 2,10 m x 1 m cada uma, que formam um grande painel chamado Vida. O conjunto, inaugurado em 2002, é assinado pelo artista plástico italiano Marco Ulgheri e explora o fenômeno da medicina como uma intervenção humana no ciclo natural da vida e da morte. O tema tratado em cada baixo-relevo tem seu período cronológico identificado por bordas decorativas e, em geral, foca-se na invenção mais do que em seu inventor”. Texto do SESC-SP
Aquele conjunto arquitetônico riquíssimo numa área mais que nobre de São Paulo, mistura passado e presente, afasta e acolhe, mata e salva a vida das pessoas, é frio e acolhedor, um conjunto de sentimentos contraditório me vêem à mente quando penso no Hospital, antes eles eram uma abstração, depois viraram concreto, e o Santa Catarina materializa fortemente esta imagem.
Só você mesmo para falar de hospital e conseguir lirismo… Desejo muita sorte nas suas visitas por lá! Beijão nas crianças!