Arnobio Rocha Estado Gotham City A Economia Política, Democracia e o Pós-Estado

1602: A Economia Política, Democracia e o Pós-Estado


A Economia pós-crise de 2008 impôs um novo Estado, autoritário e direitos restritos.

“dorme à vontade, mas fica sabendo:
as dívidas que hoje me atormentam
a ti atormentar irão um dia.
(As Nuvens – Aristófanes)

O debate sobre a produção de valor é o mais fundamental de todos os debates, sem ele ficamos andando às cegas, escolhendo pontos isolados ou abraçando visões que, invariavelmente, leva ao abandono de um método científico de análise da economia e da política, muitos se tornam “místicos”, repudiam o Kapital como se fizessem danças para trazer chuvas.

A forma ulterior de exploração do Kapital ganha maior dinâmica na sofisticação da produção, introdução de tecnologia, robôs ou de algoritmos poderosos nos software e aplicativos, assim como a Uberização do Trabalho (meio) e não pode ser visto como fim da produção de valor. Bem como convém lembrar que o “kapital” não gera valor, ao contrário, o Valor é que é o fulcro do kapital.

O que significa que a pornográfica nuvem de trilhões dos mercados especulativos, só se realiza com a produção de valor, de outra forma, a nuvem induz mais produção/produtividade em escala global, facilitando a apropriação privada, por cada vez menor o número de capitalistas, famílias, que vistas de forma geral, cerca 750 destas, detém 81% da renda mundial.

A crise dos Estados Nacionais, democracia e política, está justamente nesse caráter global de realização e de apropriação do Valor, muitas vezes percebidos, com as transações de ações nas Bolsas de “Valores”.

Marx trata, vejam só, ainda no Livro III, afirma que “o crédito acelera as erupções violentas da contradição -crise- e, portanto, os elementos de desintegração do antigo modo de produção. O sistema de crédito aparece como o principal nível de sobre – produção e super – especulação no comércio somente porque uma maior parte do capital social é empregado por pessoas que não são seus proprietários e que, conseqüentemente, vêem as coisas de maneira diferente do proprietário… Isso demonstra simplesmente que a auto-expansão do capital permite um livre desenvolvimento real apenas até certo ponto, de modo que, de fato, constitui um freio e uma barreira iminente à produção que são continuamente transgredidos pelos sistemas de créditos”.

Essa é a questão, a Economia Política, em Marx, continua como método fundamental para compreensão da formas que o Kapital se apresenta, no passado e agora, com todas as novas tecnologias.

A “nuvem” ou os “mercados” que seduz de forma tão violenta os analistas do capital como Miriam, Sardenberg, não pode também causar espécie entre nós, o rigor, a necessidade estudar os fenômenos sem nos deixar seduzir pelos dois lados: o da “expansão financeira” como fim último do Capital, escondendo o mais importante que é a reprodução ampliada do Capital e sua busca vital pela recomposição da Taxa de Lucros.

Nem pelos dogmáticos da “crise permanente” que apenas enxergam (sic) o declínio do Capital, mas não explicam a sua recuperação e sua expansão entre uma crise e outra.

O velho Estado, dominado pelos banqueiros, fez a maior operação de salvação do Kapital da história, cerca de 40% do PIB dos EUA e quase 33% do PIB da UE é usado para injetar dinheiro nos bancos e segurar o sistema como um todo, a maior transferência de riquezas da história moderna.

Os números são superlativos e ajudam a entender a razão de que apenas 8 PIBs depois, descontada a inflação, os EUA voltaram a ter um PIB positivo, ante 2005. A UE ainda patina e estaciona diante da riqueza produzida de 2007, que já não é mais alcançada.

Tudo isso acabou sendo o resultado da Crise a maior concentração da riqueza, como se isso fosse possível. A classe média americana foi esmagada, as suas hipotecas, que compunham significativa parte de sua renda, foram executadas, por anos o crédito “fácil” sumiu. Isso reflete diretamente no controle mais rígido do Estado

Uma nova forma de dominação, por outro lado, se impôs com as novas exigências de recomposição da Taxa de Lucro, o santo Graal do Kapital.

O pós-Estado, a pós-verdade, como quiserem denominar, prefiro Estado Gotham City, esse novo Estado ele vem corroendo as bases da sociedade burguesa, especialmente as coisas que mais a distinguia: A  Democracia e da Política. O que nasce são regimes autoritários, com simulacros de Democracia e quase ausência de Política.

As “Primaveras Digitais”, as Jornadas de Junho de 2013, conscientes ou não, foram peças fundamentais para essa nova ordem sem Democracia e Política. Elas chancelaram todas as visões do Kapital que na necessidade de recompor sua Taxa de Lucro, rompeu com o que sobrou do Estado de Bem-Estar Social, cortando Direitos Sociais, Aposentadorias, Saúde e Educação.

Para fazer a transfusão de recursos dos tesouros públicos para os bancos privados, de forma direta ou através de privatizações, entrega das funções do Estado para entes privados, de forma ampla, atingindo judiciário, segurança, mais ainda na burocracia, especialmente as famigeradas Agências, que minaram as funções do Estado e entregam e agem em nome do Kapital, sem meias palavras.

Portanto, a ordem legal, é a de restrições, o Direito é o do inimigo, aplicado diretamente contra quem se opuser aos novos senhores do Estado, quer seja Obama ou Trump, pode ser Putin ou um burocrata chinês, passando até na ralé do Golpe local, o golpista-menor, Temer, ou o neofascista Bolsonaro.

O mundo assistiu ao Brexit, a Direita vs Extrema-Direita, na França, ou a pressão pela saída da Itália da UE. Alguma surpresa com o quarto mandato da Sra Merkel, ou de que a extrema-direita nazista é a terceira força na Alemanha, aquela mesma de Hitler, a história se repetindo como farsa.

O surgimento de movimentos abertamente nazistas, sem nenhuma máscara, nos EUA é o reflexo do maior recrudescimento dessa realidade. O Estado serve a uma minoria restrita, a classe média esmagada pela crise, serve de base social a esse tipo de movimento. O que lembra muito a classe média verde-amarela, na Paulista, com a mesma ideologia neofascista, contra o Estado, quase um suicídio, pois menos estado significa menos democracia e menos direito.

São movimentos combinados de uma ampla ruptura, não um Estado de Exceção, apontam para uma nova ordem, cruel, restritiva e de profunda violência, com uma possibilidade permanente de guerras regionais, civis e de embates violentos nas grandes cidades, pela miséria e fome.

A Política do Medo, Segurança nos países ricos, Corrupção nos países pobres, será o elemento principal de convencimento para que se abra mão das mínimas garantias legais e democráticas.

Aqueles super-ricos, 1% da população, se armaram de todos os instrumentos legais, de dominação, de convencimento ideológico, com uso massivo da Internet, o que tolamente achávamos que ampliaria a participação, os algoritmos se tornaram a arma letal para saber quem somos, o que fazemos, o que pensamos, assim, o controle é mais forte, violento e amplificado.

Eles sabem o que fizemos no verão passado.

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