Arnobio Rocha Mitologia Édipo Rei ou a maldição dos Labdacidas (Nova Versão)

832: Édipo Rei ou a maldição dos Labdacidas (Nova Versão)


Edipo e a Esfinge.

Edipo e a Esfinge.

 

A origem de Tebas

 

Cadmo e os Dentes do dragão

 

O Rei de Tebas Laio descende de uma família amaldiçoada, desde seu bisavô, Cadmo, fundador da cidade/estado, pois ele  matou um dragão de Ares (Deus da Guerra). Dos dentes do dragão plantados por Cadmo, nasceram gigantes chamados Spartói, os “semeados”. Espertamente Cadmo colocou-os em luta sobrevivendo apenas 5 de quem se torna amigo e juntos fundam a cidade.

O primeiro “pecado” da família cometido por Cadmo, morte do Dragão, foi expiado quando se fez escravo de Ares por 8 anos(miticamente é um Rito Iniciático do Guerreiro). Casa-se com Harmonia e têm quatro filhos: Ino, Agave, Sêmele e Polidoro. Sua filha, Agave, se casa com o Gigante Equíon, sendo mãe de Penteu, que seria o sucessor de Cadmo. Penteu, com sua hybrys contra Dionísio (Baco) acaba sendo sua desgraça, pois ao mandar aprisionar o Deus do Vinho, este faz com que Agave, uma de suas bacantes mate o próprio filho.

Polidoro irmão de Agave tem um filho, Lábdaco, que será o candidato ao trono do avô, mas como era muito jovem, seu tio Nicteu assume o trono, mas pouco depois se mata, sendo substituído pelo jovem Lábdaco. Este ao assumir trono também se rebela contra o culto a Dionísio e suas Bacantes, mais uma vez o deus faz com que suas seguidoras despedacem um Rei que não lhe era fiel.

 

(As bacantes)

 

Novamente o trono de Tebas fica à deriva.  Lico, um tio de Lábdaco assume interinamente até que o pequeno  Laio possa tomar às rédeas da cidade. Porém uma guerra entre Lico e os filhos de Nicteu (Anfião e Zeto) fez com que Laio fosse exilado na corte de Pélops, o amaldiçoado filho de Tântalo.

Laio herda as mazelas de caráter religioso de seus antepassados, em especial de Cadmo que matara o Dragão de Ares e de Lábdaco que opôs ao culto do Deus do êxtase e do entusiasmo, mas para complicar mais ainda ofende a Pélops quando lhe rapta o filho Crísipo e o seduz, de uma só vez atraiu a ira de Zeus deus da hospitalidade e a Hera dos amores “legítimos”. (inaugura miticamente a pederastia na Grécia).

 

Édipo, de pés inchados



(Laio e Jocasta)

 

Laio volta à Tebas e assume o trono casando-se com Jocasta,  sabedor de  que carrega contra si as maldições dos deuses, manda consultar o oráculo de Delfos sobre seu futuro e de seus reinado. A resposta é direta – se tiver filhos com Jocasta, este o matara e desposará a mãe.  Mesmo ciente, da maldição do oráculo. Laio e Jocasta têm um filho, imediatamente renegam o bebê, entregando-o a um escravo para que o abandonasse nas montanhas com pés atados, segundo outras versões ele é colocado dentro de um cofre e jogado ao mar.

O escravo condoído com o destino da pobre criança leva-o ao monte Citerão e o dá a outro escravo da cidade de Corinto. Este leva a criança e o entrega a Mérope, rainha da cidade, esposa do Rei Pólibo, que não tinha filhos. Ao  recebê-lo dão-lhe o nome de Édipo (Oidípus – Pés Inchados) criando como um filho.

Édipo cresce feliz em Corinto e próximo a completar maioridade resolve consultar o oráculo de Delfos e lá a pitonisa o amaldiçoa dizendo que ele matará o pai e desposará a mãe. Diante do terrível vaticínio resolve fugir para longe de Corinto, para não cumpri seu destino.

(A morte de Laio por Édipo)

 

Próximo a Tebas o jovem é interpelado por uma parelha dirigido por um senhor que tentar agredir-lhe, ele se defende e na luta mata o homem e seus escravos que o seguia. Ao chegar à entrada da cidade uma terrível Esfinge interpõe-lhe o caminho anunciando um enigma, que é completado com a frase: “Decifra-me ou devoro-te”. Édipo decifra e mata a esfinge.

Ao entrar na cidade é saudado como libertador. É levado à presença da Rainha, que perdera tragicamente o marido, morto segundo se comentava por salteadores fora da cidade. Rapidamente o jovem é feito esposo da rainha e do seu enlace, nascem quatro filhos (Polinices,Eteócles,Ismênia e  Antígone). Vivem felizes até aparecer um novo mal à cidade de Tebas. Uma terrível peste assola a cidade e nada do que se planta se consegue colher. Édipo manda consultar o oráculo de Delfos.

Leva a presença de Édipo, Tirésias o adivinho dos mistérios de Delfos, tem como resposta de que o assassínio de Laio não fora vingado e a cidade estava corrompida pelo incesto. Provocado pelo Rei ele diz que Édipo é o pecador. Este não lhe dá crédito. Chega um mensageiro de Corinto anunciando a morte de Pólibo e que Édipo deve assumir-lhe o trono. Satisfeito por não ter matado o pai e triste por sua morte, Édipo pergunta ao mensageiro sobre seu passado em Corinto, este lhe conta que fora ele quem o tinha encontrado bebê no monte Citerão.

Desesperado, Édipo chama os antigos escravos que lhe confirmam a desgraça. Jocasta que a tudo assistia se mata. Édipo fura os olhos e exila-se na cidade sagrada de Colono, cercanias de Atenas, pois ele lá não podia entrar.

 

Comentários sobre a Tragédia das tragédias


Apesar de ser um tema muito corrente e popularizado pelo que Freud denominou: Complexo de Édipo, esta tragédia tem ângulos muito maiores e mais densos, não podendo ser entendido apenas por esta interpretação.

Uma primeira visão é entender que o teatro, poesia grega, era largamente usado para dar amalgama a cultura, laços e identidade da civilização helênica. Portanto esta função de educar, passar valores é fundamental como bem observa Jagger na Paidéia.

Depois o teatro servia como forma de disseminar as leis e práticas toleradas pelas cidades-estados. A condenação ao parricídio e crimes de sangue bem como o combate às relações incestuosas foram leis publicadas por Solón. Os escritores eram convocados a escreverem para o estado sobre temas de interesses da sociedade.

Freud foi brilhante na identificação do conflito estabelecido, partindo de uma visão dos desejos sexuais primevos que a criança tem com a mãe e o ódio em relação o pai. Destes dois vetores chegaremos ao âmago da tragédia edipiana.

Já Jung, não despreza os elementos da libido, porém acha que esta quando represada vai refluir para outros canais (o tempo fático de mais de 20 anos entre o nascimento e as primeiras relações sexuais entre Jocasta e Édipo, lhe dará razão). Em tempo, a ruptura entre ambos, Freud e Jung, esta calcada nesta diferença de interpretação.

Cabe lembrar ainda que a luta entre o Rei velho, que já não tem energia para “fecundar” a natureza, contra o jovem príncipe, para que a “força mágica”, vigor sexual, esteja acesa e mantenha o progresso da sociedade são coisas ainda hoje observadas largamente. Aqui também deve se salientar a mudança da sociedade matriarcal para uma de clara orientação patriarcal. A disputa pelo poder dar-se-á de forma violenta e fratricida.

O mais interessante é que 2500 anos depois nos pegamos a discutir uma tragédia tão magnificamente escrita, que traz muito do que somos, de como fomos educados, em quais elementos culturais nos baseamos, nossos valores, éticos, políticos e religiosos.

(Publicado originalmente em 27 de maio do 2010)

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