Arnobio Rocha Crise 2.0 Crise Dois Ponto Zero – Apresentação do Livro Crise 2.0

804: Crise Dois Ponto Zero – Apresentação do Livro Crise 2.0

 

Cartaz da peça Prometeu 06, a partir de textos de Ésquilo e Heiner Müller

 

“Religionum animum nodis exsoluere pergo esforço-me por libertar o espírito dos nós das superstições”  (Tito Lucrécio Caro – De Rerum Natura, I, 932)

A decisão de escrever a série Crise 2.0 foi um mero acaso, mas depois de vislumbrar ali uma chance de colaborar de forma positiva e propositiva ao debate, que, a meu ver, é o mais crucial entre todos, pois, conhecer os desígnios da Economia Política é uma ferramenta poderosa para lidar com qualquer outro debate. Dificilmente, sem o domínio mínimo dos elementos fundamentais sobre o funcionamento do sistema, se consegue intervir de forma coerente e decisiva na política, desde a mais ampla, o jogo do poder, até a mais colateral (não menos importante) como a questão dos costumes, da sexualidade, racismo ou xenofobia. Conhecer a dinâmica do sistema é condição primeira, para melhor se contrapor a ele.

De certa forma, assim espero, o papel da série, do blog, e agora deste livro, foi cumprido a contento. Sem dúvida, alimentava muito mais esperança no que poderia impulsionar, mas, mais uma vez recorro à literatura, ao meu inestimável Dante, para lembrar sua lição única: “Deixai toda esperança, vós que entrais”. Sabedor disto deveria ter sido um pouco mais cauteloso, pois, o “Infernum” já está a muito organizado, não se pode vir de “fora”, tentar mudar uma lógica, que mesmo não funcionando, parece ser a melhor encontrada, a que aliena de suavemente, quase indolor. É eficaz o sistema que a todos adorna e atende, desde que rebaixemos nossas expectativas reais de mudança, se acoplar a ele, ser por ele gentilmente dominado, mesmo com os escritos ou os discursos mais radicais.

O servilismo, ainda que aparentemente hostil, é o que há de mais sofisticado e devidamente permitido pelo sistema, a internet virou o campo mais fértil para esta onda, de aparente questionamento ao sistema, aliás, até incentivado por ele, já que de alguma forma a causa, a revolta, alivias as tensões. Por mais chato que seja, vou continuar a repetir, como mantra: Sem Teoria, sem conhecimento e sem ação, nada, ou quase nada se muda. Parece coisa século XIX e, é. Contudo, é uma questão inescapável, por mais forte e próximo (será mesmo) o “contato” via rede, sem saber o que queremos, ou por que nos contrapomos ao que nos cerca, é tudo em vão.

A realidade é que a queda do Leste, não trouxe uma revolução dentro da revolução, não recuamos a 1928, ao contrário, voltamos à pré-revolução, uma restauração completa, todo o leste ruiu, houve um triunfo completo do império único. As relações daquele longínquo 1992 que teve em Fukuyama a voz dos vencedores “acabou a história e temos o último homem”. O impacto era enorme, as organizações, pequenas ou grandes, de esquerda, são tomadas pelo sentimento de que tudo ruíra, em primeiro lugar, a ideologia socialista.

O desarmamento não foi imediato, foi paulatino e contínuo, ano a ano, mesmo diante das crises que teimavam em reaparecer, as respostas era parciais ou sem convicção, a militância mais ideológica foi abatida, sem esperança ou força para reconstruir a sua Utopia. Aceitou, não pacificamente, mas de certa forma, tacitamente o retrocesso, como final. Os anos 90 o mundo foi sacudido por três crises graves (tigres asiáticos, Russa e dívidas), mas sem reação, a ideologia do pensamento único prevaleceu.

Os anos 2000 iniciou-se com 11 de setembro, a reação ao império único foi dada, não por uma ideologia anticapitalista, mas uma ação religiosa. A reação dos EUA fez crescer a pressão contra qualquer liberdade ou questionamento ao império. As invasões de países como Afeganistão, Iraque, ocupação do Paquistão e ações na África, demonstram que nada se contrapõe ao EUA. Senhor do mundo e dos destinos da humanidade. A sua força, mesmo que desmoralizada pela ousadia de Bin Laden se tornou mais viva e presente no mundo.

Mas aí a hidra do Capital, nossa velha conhecida, a Crise de Superprodução, voltou a aparecer. O ano foi 2005, mas se preferirem, Lehman Brothers em 2008. É quase um renascimento de Marx, agora visto como visionário, quase profeta, não como um revolucionário, que questiona as bases do sistema capitalista. O nosso desmonte foi tão grande, que até é difícil encontrar referência e análises do significado da atual Crise.

Os EUA entraram na pior crise de sua história, desde 1929, a Europa que poderia contrabalançar o Capital, mergulhou num caos, mesmo assim continuamos desarmados. A ideologia, nosso fogo de Prometeu, nos foi tomada de volta por Zeus.  As experiências do Brasil, sem ser cair no umbigo local, é de longe a maior reação à ideologia dominante, cheia de contradições, vacilos, traições de classe. Mas foi um dos poucos movimentos em que o Capital domina, mas não é seu projeto hegemônico que dirige os destinos de uma grande nação.

Nada se fechou ou se abriu, foi apenas um espasmo, no fundo é este o sentimento, não de superioridade, ao contrário, é de frustração de não ter sido capaz de despertar mais debate, mais conhecimento, mais teoria, mais ação. O deserto ideológico, já dura uma geração inteira, sem que apareça novos atores, que olhem o passado como fonte de saber, não com desprezo. A minha se conformou, se acoplou ao sistema, mas de certa forma lutou, deu o combate, mas foi incapaz de superar a queda do Muro de Berlim. Pensei que, com a queda do Muro de Wall Street, abriríamos um novo momento, por enquanto, nada. Ou talvez, enxergue muito pouco.

A nossa luta atual é para achar de volta nossa Utopia, será que é nesta geração? Do meu lado, faço um esforço teórico para discutir a atual Crise, com olhos marxista, denominando-a de Crise 2.0,  convido todos à leitura e ao debate, principalmente aos mais jovens.

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